Tina Turner vence o seu último Grammy
A sombra de Ike já se tinha dissipado. Cinco anos antes, Private Dancer tinha anunciado isso mesmo - e com estrondo. Se nos anos 1960 e 1970, quando era metade desses Ike & Tina Turner entusiasticamente apontados como referência pelos Rolling Stones, Sly Stone ou David Bowie, fora um inspirador furacão em palco a que escapou sucesso comercial, os anos 1980 foram os do renascimento, emancipada do marido abusivo e com glamour de estrela reverenciada mundialmente.Em 1989, pelo álbum Tina Live in Europe, venceria o Grammy para Melhor Vocalista Rock Feminina, o sexto desde Private Dancer. Anos antes, a sua editora recusara apostar em alguém que considerava ultrapassada e sem potencial. Grave erro de avaliação. Contra todas as expectativas, tornara-se uma das figuras emblemáticas da década de 1980, marcando-a em música e imagem.
Tornar-se-ia, também, um exemplo de coragem e perseverança quando o biopic What"s Love Got To Do With It, protagonizado por Angela Bassett e especialmente centrado na violência física e psicológica sofrida durante os 16 anos de casamento com Ike Turner, se transformou num dos grandes êxitos de bilheteira de 1993.
Em 1989, quando foi distinguida com mais um Grammy, tudo isso era já passado distante. Em 1989, Tina "Hot Legs" Turner era uma instituição da música popular urbana, reverenciada pelo público e pelos seus pares. Mas uma instituição com voz infernizada e movimento de anca pouco solene, como fez questão de nos relembrar há algumas semanas quando, na última cerimónia dos Grammys, interpretando Proud Mary em dueto com Beyoncé, a sua energia pareceu desmentir a cada segundo os 42 anos que a separam da jovem diva soul.
Mário Lopes