O dia em que dançámos eufóricos com os Go! Team
Mesmo no final, MC Ninja provoca-nos novamente. Ensina pela enésima vez o refrão da canção que se segue, mesmo sendo desnecessário. Pede saltos e festa e tanta euforia na plateia como no palco (também não era preciso, que a população que esgotou o Lux estava eufórica há muito). Ainda assim, a insaciável Ninja, dínamo de energia incontrolável, insistou: "Do it! Do it! Alright!" À nossa frente, abre-se uma mini clareira para que um rapaz de tamanho considerável possa pular e dançar e cantar sem pôr em perigo a integridade física dos que o rodeiam. Em frente, ao palco, ouvimos de fugida no final do concerto, houve quem saltasse abraçado, sorriso parvo estampado no rosto, porque, simplesmente, não há receita conhecida para resistir a isto.Isto: Os Go! Team, seis músicos a trocar de instrumento tão rápido quanto, nas canções, se sucedem ritmos de hip-hop velha guarda, guitarras em explosão sónica, coros de girl-group e metais Bacharach a pontuar um combate entre Rocky e Apollo Creed - sem sangue à vista, os dois pugilistas bailam no ringue em coreografia infantil.
One, two, three, four: tiro de partida para Wrath of Marcie, Panther Dash, Titanic Vandalism ou Doing it Right. One, two, three, four: Ian Parton, o mentor, inventa melodias western-spaghetti na harmónica, Sam Dook agarra-se à guitarra e, estrela rock"n"roll, salta como Pete Townshend, Kaori Tsuchida dispara mais uma camada de som do sintetizador, o "afro" de Jamie Bell abana-se em sintonia com a linha do baixo e a circunspecta Chi Fukamy Taylor, na bateria, assegura o ritmo que faz a máquina avançar. E depois Ninja, meias listadas pelo joelho, top, mini-saia, um sorriso transbordante e mil coreografias por minuto: a cheerleader para acabar com todas as cheerleaders.
Antes do concerto, enquanto se ouvia a boa selecção de soul disparada pelas colunas de som, dir-se-ia que este estava "ganho" à partida - a excitação do público denunciava-o. Nada poderia falhar. A banda sobe a palco e ouve-se essa The Power Is On que transforma o tom apocalíptico dos Public Enemy em revolução dançante. A multidão indie ergue os braços ao ar e faz a festa como previsto, a multidão indie percebe que o som não é o melhor (um irritante e insistente feedback foi a única mácula da noite) mas não parece preocupada com isso. Fosse outra a banda e tal seria suficiente para destruir a fruição do momento. Acontece que os Go! Team não são "outra banda".
Ouvimos We Just Won"t Be Defeated e saltamos sobre o feedback para juntar a nossa voz à deles. Anuncia-se Grip Like a Vice, primeiro single de Proof Of Youth, o segundo e mais recente álbum, e deixam-nos sem guarda: Kaori Tsuchida dispara a sirene de um megafone de plástico (esta é para ti, Pascal Comelade), Sam Dook inventa turbilhões sónicos que se revolvem ao compasso do ritmo, os metais samplados sobrevoam o cenário de uma blaxploitation imaginária e Ninja incita To all the ladies: Yeah!, respondem as ladies e todos os outros.
Temos portanto que o feedback foi muito irritante e tornou imperceptíveis as subtilezas desta música. Concluímos, porém, que tal não passou de pormenor insignificante quando, após o obrigatório encore, o concerto chegou ao fim. Tínhamos ouvido Ladyflash, o single de Thunder Lightning Strike que os revelou, tínhamos celebrado com bom movimento de anca e euforia uma banda que inventa música contagiante de um cruzamento inesperado, mas que resulta estranhamente familiar, do lixo e do luxo de quatro décadas de cultura pop.
Como diria personalidade mediática, fomos muito felizes no concerto dos Go! Team. E ouvimos alguma da música mais criativa e contagiante que, até agora, trouxe até nós este convulsivo século XXI.
Mário Lopes