"O músico é aquele que escuta"
a Sabe o que é música sufi? Pode ficar a saber hoje à noite, às 21h30, na Culturgest, pois está em Lisboa o Ensemble Ibn Arabi, onde tocam verdadeiros mestres desta tradição musical. O nome do grupo explica uma parte: Ibn Arabi, escritor e poeta nascido no século XII, foi uma das grandes figuras do sufismo, um mestre cujos escritos e ensinamentos continuam a ser fundamentais para os que se lançam no percurso iniciático do sufismo. "O sufismo é a via mística do islão, e a música e a poesia são práticas essenciais", explica-nos Ahmed El Khelig, marroquino (de Tanger) estudioso do sufismo, divulgador da música sufi em programas de rádio e fundador do Ensemble. Ele é também tocador de qanun, um instrumento de corda dedilhada semelhante à cítara, e que se pensa ser de origem egípcia. A tradição sufi nasceu na Mesopotâmia no século IX, mas existiu com força na Península Ibérica. Ahmed El Khelig diz que "na cidade de Silves, no Algarve, e em Lisboa também, viveram grandes figuras do sufismo." Isto para além da Andaluzia, onde continuam a existir muitos traços da presença muçulmana.Para o fundador do Ensemble Ibn Arabi, a essência do sufismo tem a ver com a espiritualidade: "Num mundo onde reina o materialismo absoluto, o sufismo indica uma possibilidade de voltar a escutar a espiritualidade, o refinamento, o amor."
Ser músico, para o sufismo, é ser "aquele que escuta". O músico escuta também "a sua espiritualidade interior", como explica Ahmed El Khelig. Cada instrumento que o grupo tocar hoje à noite na Culturgest tem um significado ou designa um sentimento diferente. Além de Ahmed El Kheligh no qanun na direcção musical, o grupo é composto por Hervé Teboul (ud e tambur), Oussama El Kheligh (violino), Pierre Rigopoulos (daf e zarb) e Abdellah el Mansor El Khelig (canto e bendir). Os cantos sufis utilizam poemas de grandes figuras do sufismo - de Ibn Arabi, Rabia al-Faridh, Sidi Mohammad al-Harrak e Omar Ibn al-Faridh.
Para o líder do Ensemble, difundir esta música em Portugal é particularmente interessante, pois "é um dos países mais próximos do mundo muçulmano e com relações muito antigas com o sufismo". E também para vencer preconceitos e desencontros - "os do Sul acham que o Norte é apenas materialista, e os do Norte acham que a espiritualidade está no Sul", diz Ahmed.
Se for à Culturgest, talvez possa ouvir aquela flauta que "não é ar nem vento, mas um fogo", que os seguidores do sufismo acreditam que nos aproxima da paz e do divino. O concerto encerra o ciclo Filhos de Abraão que decorreu durante quase um ano na Culturgest, em Lisboa e que propôs a escuta de músicas ligadas a diferentes culturas e religiões.