Doentes neuromusculares querem reforma antecipada sem penalizações
Regime já existe para os doentes com sida, cancro, esclerose múltipla e paramiloidose
a Aos 52 anos, Manuel Matos, um professor de Vila Nova de Gaia que sofre de uma doença neuromuscular profundamente incapacitante, vive angustiado com o futuro. Graças ao apoio incondicional dos pais, sobreviveu durante todo este tempo à doença de Werdnig-Hoffman (atrofia espinal tipo 1), uma patologia rara que costuma ser fatal na primeira infância. Apesar da gravidade da doença, conseguiu estudar, tirar um curso superior e deu aulas durante 28 anos até ficar completamente imobilizado. Actualmente de baixa, com os pais a aproximarem-se dos 80 anos e já com muitas dificuldades em proporcionar-lhe a assistência necessária - precisa de ajuda até para tossir porque os músculos de respiração quase não funcionam -, teme ficar condenado "a uma prisão no deserto", se eles "falharem".
A perspectiva da reforma antecipada por invalidez ainda o assusta mais. É que Manuel, quando se reformar, verá o seu rendimento mensal diminuir para quase metade do valor actual, o que fará com que se torne incomportável contratar várias pessoas que lhe possam prestar os cuidados de que necessita durante as 24 horas do dia - chegou a um ponto da doença em que precisem que lhe aspirem a própria saliva.
Ainda que de uma gravidade extrema, o caso de Manuel é um entre muitos outros. A Associação Portuguesa de Doentes Neuromusculares (APN) decidiu divulgar a sua história com o intuito de chamar a atenção para "a situação dramática" em que se encontram muitos dos doentes que sofrem deste tipo de patologias, que se estima afectarem cerca de cinco mil pessoas em Portugal.
Sem ter contado ao longo do seu percurso com apoios da Segurança Social, Manuel pretende agora que equiparem a sua situação à dos doentes com sida, cancro, paramiloidose e esclerose múltipla, para quem a lei prevê a reforma antecipada sem penalizações. Justificação: estas doenças determinam "situações extremamente invalidantes". "Então e a doença de Manuel? Não podia ser mais incapacitante", acentua Assunção Bessa, presidente da APN, que se confessa "cansada" de bater a todas as portas para convencer os que têm poder da necessidade de criar respostas para este tipo de situações. "Se os pais de Manuel morrerem, ele sabe que o seu destino estará selado", lamenta.
Com a consciência aguda desta espécie de morte anunciada, Manuel destaca a urgência da criação de uma nova figura profissional: o cuidador de pessoa que não é auto-suficiente. Porque não há instituições em Portugal preparadas para acolher este tipo de doentes e porque os subsídios existentes e as comparticipações das ajudas técnicas não estão adaptadas às especificidades destas patologias. Basta ver que o subsídio por assistência a terceira pessoa é de 82,58 euros por mês. E quem cuida - muitas vezes de dia e de noite - recebe sempre esta quantia. Assunção Bessa já fez as contas: "São 11 cêntimos por hora."