Os gregos no Museu Gulbenkian
7000 anos de história em peças de museu privado de Atenas
a Uma viagem no tempo. É o que propõe a mostra Os Gregos. Tesouros do Museu Benaki, Atenas, que foi ontem inaugurada na Galeria de Exposições Temporárias do Museu Gulbenkian, em Lisboa. São 7000 anos que se contam através de 157 peças organizadas cronologicamente, que ilustram as mudanças de uma civilização que se expandiu, se deixou contaminar e lançou os alicerces da cultura ocidental.
Livros, têxteis, obras de escultura, pintura e ourivesaria propõem uma viagem de milénios, desde as culturas que desabrocharam no tempo do neolítico, a partir de 6800 a.C., no espaço da Grécia actual, até à assinatura do Tratado de Roma, que em 1827 conduziu ao reconhecimento do Estado grego. São pequenos fragmentos de história que não deixam esquecer as conquistas do reinado de Alexandre, o Grande, a sua campanha contra os persas, as marcas dos romanos em terras gregas, nem a intensa actividade artística que acompanhou o apogeu dos impérios bizantino e otomano.
A iniciativa resulta de uma colaboração entre o Museu Gulbenkian e o Museu Benaki, o mais antigo museu privado da Grécia, fundado em 1930 pelo coleccionador Antonis Benakis, membro de uma conhecida família da diáspora grega, que viveu em Alexandria e no Egipto. "Quando se instalou em Atenas doou a sua colecção e a mansão de família, que hoje acolhe o Museu Benaki, e que desde então tem sido desenvolvido e enriquecido", conta Electra Georgoula, comissária grega da exposição.
Não é o primeiro contacto entre as duas instituições. Em 2001 a Gulbenkian enviou para uma exposição internacional organizada pelo museu ateniense algumas peças da sua colecção de arte islâmica, empréstimos que se repetiram em 2004. "Penso que estas colaborações aproximam culturalmente os dois países, estreitam os laços entre gregos e portugueses e destacam a convicção comum das duas instituições de que a história, arte e cultura alargam a comunicação e compreensão", acrescentou a comissária grega. Algumas das peças agora expostas na Gulbenkian, até ao dia 6 de Janeiro de 2008, já foram exibidas na Austrália e, no próximo ano, devem seguir até ao Canadá. Mas a mostra portuguesa, em preparação desde Março passado, conta com algumas alterações, garante a comissária portuguesa da exposição, Rosa Figueiredo.
De forma a facilitar a compreensão, o percurso da exposição, que vai do neolítico até ao século XIX, está dividido em 13 pequenos grupos. "Desses núcleos destacámos uma peça que achámos mais importante e que podia atrair mais o visitante", explica Rosa Figueiredo.
Há objectos que, pela primeira vez, saem do museu Benaki para ser expostos no estrangeiro. É o caso do enorme Lêkythos, um vaso esculpido em mármore no século IV antes de Cristo, com 1,47m de altura. Foi escolhido para abrir a exposição pela sua "sumptuosidade e elegância", explica Rosa Figueiredo. "É uma peça funerária, mas que guarda a nossa memória, afinal a nossa memória vem dos gregos", sublinha a comissária.
Outras peças, pelo valor estético e preciosidade, estão expostas em vitrinas isoladas. O Kylix com asa, por exemplo, uma espécie de cálice produzido em folha de ouro pelos artesãos do século XV a.C., é uma das peças em destaque, pela precisão dos desenhos em relevo, três cães em galope veloz, uma convenção associada à vitalidade na civilização micénica. Assim, como a estatueta feminina datada do período cicládico inicial, entre 2700 e 2300 a.C., que conserva ainda pigmentos de cor vermelha que realçam os traços anatómicos e deixam supor que representasse uma deusa da fertilidade, uma ninfa ou um espírito protector. Peças únicas, que guardam ainda os mistérios do berço da nossa civilização.
Ciclo de conferências
No âmbito da mostra, a Gulbenkian organizou vários eventos que se conjugam com a celebração dos tesouros gregos. As Luzes da Grécia é um ciclo de quatro conferências, que terão lugar nos dias 15 e 29 de Outubro, 26 de Novembro e 6 de Dezembro, no Auditório 3 da fundação, às 18h, e que pretendem debater o contributo da Grécia como grande matriz da cultura europeia.
A Obra em Foco, iniciativa habitual da Gulbenkian, foi também escolhida em função da vinda da colecção Benaki: A Religião na Grécia Antiga - Deuses do Olimpo Representados na Colecção Gulbenkian é uma mostra de moedas dedicadas aos deuses da Grécia Antiga que, segundo Rosa Figueiredo, "tem tido um sucesso fantástico". Para abrilhantar a mostra, a Gulbenkian promoveu ainda o "regresso a casa" de um torso masculino grego executado em mármore no século V a.C., doado por Calouste Gulbenkian ao Museu de Arte Antiga quando ainda não planeara deixar a sua colecção em Portugal. "Se ele, na altura, já soubesse o futuro das suas peças, não fazia sentido privar a colecção Gulbenkian daquele torso", conta Rosa Figueiredo. A Gulbenkian conseguiu agora um empréstimo a longo prazo da peça, inaugurada ontem em conjunto com a mostra do Museu Benaki.
Os Gregos. Tesouros do Museu Benaki, Atenas LISBOA Galeria de Exposições Temporárias do Museu Gulbenkian, de 3ª a dom., das 10h às 18h. Até 6 de Janeiro. Bilhetes a 4 euros. Tel.: 217823000
De cima para baixo: Atenas vista do rio Ilissos, 1834, de Johann Michael Wittmer, aguarela sobre papel; Retrato de Homem com Trajo Grego, c. 1825-1826, de Richard Parkes Bonington, óleo sobre tela; Kylix com asa em folha de ouro, Argólida, Peloponeso, finais do século XV a.C..
À direita: Estatueta feminina, mestre do Fitzwilliam,
c. 2700-2300 a. C., mármore branco