Secil na Arrábida é incompatível com candidatura a Património da Humanidade
Secil solicitou ao Governo licença para a exploração, em mais 60 metros de profundidade, das pedreiras do Outão, o que lhe permitirá aumentar a sua esperança de vida em mais 23 anos
a O vereador do Ambiente da Câmara de Setúbal, André Martins, considera que o Governo está a ir "pelo caminho mais fácil" ao conceder à Secil uma nova licença de exploração das pedreiras do Outão, na Arrábida, que permitirá à empresa prolongar a sua actividade até 2044. Na próxima quarta-feira, o autarca da CDU vai levar à reunião pública do executivo uma "tomada de posição sobre a matéria", mas adianta que é
sua intenção desafiar o Governo a es-
tudar a "retirada progressiva da Secil" do Parque Natural da Arrábida (PNA). Em alternativa, defende que se comece a equacionar a possibilidade de reconversão das pedreiras, nomeadamente para uma utilização turística.
"A actividade da Secil está a destruir a serra da Arrábida e é incompatível com a candidatura daquela área a Património da Humanidade, que temos em curso", sublinha André Martins.
Conforme o PÚBLICO tinha avança-
do em Julho, a Secil solicitou ao Governo uma licença para a exploração, em mais 60 metros de profundidade, das pedreiras de calcário e de marga da fábrica do Outão, o que lhe permi-
tirá aumentar a sua esperança de vida em mais 23 anos, relativamente às últimas estimativas efectuadas com base nos planos de lavra para as cotas de 100 e 120 metros.
O processo revestiu-se, no entanto, de alguma polémica, uma vez que não houve consenso no seio da comissão directiva do PNA no que respeita aos requisitos prévios para emissão da licença. Os três membros da comissão - a então directora do PNA, um representante das autarquias de Setúbal, Palmela e Sesimbra e a vice-presidente do Instituto de Conservação da Natureza (ICN) - dividiram-se entre a necessidade de realização de um estudo de impacte ambiental e de, apenas, um estudo de incidências ambientais - sendo certo que este último prescinde da fase de consulta pública.
Parecer desfavorável
Apesar de ter vingado, neste ponto da discussão, a interpretação do regulamento do Plano de Ordenamento da Arrábida que aponta para a realização de um estudo de incidências ambientais, a directora do PNA, Madalena Sampaio, viria mais tarde a dar parecer desfavorável ao documento apresentado pela Secil, voltando a recomendar a avaliação de impactes com consulta pública. Só que a aprovação deste parecer foi feita numa reunião que o ICN viria a considerar nula, por não ter contado com a presença da vice-presidente daquele instituto. Madalena Sampaio está mesmo a ser alvo de um processo disciplinar por alegadas " irregularidades administrativas", uma vez que não convocou por escrito, e com 48 horas de antecedência, a vice-presidente do ICN para a referida reunião - a última realizada com o modelo das comissões directivas com representação das câmaras municipais, antes da reestruturação do ICN.
José Charneira, vereador da Câmara de Palmela e representante das autarquias, e Madalena Sampaio já foram ouvidos no âmbito deste processo disciplinar, mas ainda não foram notificados do teor da acusação.
Em declarações anteriores ao PÚBLICO, a ex-directora do PNA não es-
condeu ter ficado surpreendida com o processo que lhe foi instaurado, nomeadamente com a carta que o
ICN lhe dirigiu. "Acho extraordiná-
rio que traga anexada cópia da deli-
beração sobre a Secil, quando naquela reunião foram analisados mais 36 processos", disse Madalena Sampaio. Entre esses processos estão pareceres desfavoráveis a construções na Arrábida, ordens de embargo de obras e informações para o Ministério Público, que também ficam sem efeito com a anulação da reunião.
A Secil já esclareceu que o processo de privatização da empresa incluiu uma garantia, por parte do secretário de Estado adjunto e das Finanças, que "as reservas autorizadas para exploração eram de 115 milhões de toneladas e da não existência de restrições à sua utilização". A empresa defende que a
privatização foi efectuada com ba-
se nestes valores e que, face às alte-
rações decorrentes do plano de exploração das pedreiras aprovado posteriormente, foi necessário efectuar uma adaptação do plano de pedreira existente.