Ladrões violentos num país calmo
Os planos do Doutor. A operacionalidade do Americano. A táctica de Jerónimo.
Histórias de grandes assaltantes de bancos portugueses
a Portugal não é um país de grandes assaltantes de bancos, apesar de haver registo de alguns casos em que, homens sozinhos ou quadrilhas, cometeram duas ou mesmo três dezenas de assaltos. O passado recente nesta matéria criminal faz, no entanto, sobressair dois nomes: Tomé Bárbara e Faustino Cavaco.Tomé Bárbara, também conhecido por Doutor, Barba Azul, Jaime, Félix, Toureiro, e muitos outros cognomes, está preso há cerca de três anos, depois de ter sido baleado por um companheiro quando tentavam assaltar uma ourivesaria no Algarve. O companheiro foi abatido por um militar da GNR que, estando a almoçar num restaurante fronteiro ao estabelecimento que ia ser roubado, se apercebeu do crime e interveio.
Não foi, no entanto, no roubo de ourivesarias que o Doutor se destacou. Os bancos, na primeira metade da década de 1980, foram a sua perdição. Foi nessa época que conheceu Faustino Cavaco, então regressado de França, para onde os pais haviam imigrado.
Sendo os dois algarvios, acabaram por se conhecer por intermédio de um amigo comum: Apolinário de Jesus Barros, mais tarde alcunhado de Zeca Diabo, que já nessa ocasião sabia o que era assaltar um banco (Vinhais).
A argúcia de Tomé Bárbara casou na perfeição com a coragem de Faustino Cavaco. Era o primeiro que planeava os golpes, escolhia os alvos, distribuía os carros (botes) a utilizar nas fugas e, até, arranjava disfarces para o grupo. Foi ele quem deu a alcunha de Americano ao comparsa, numa ocasião em que, preparando um assalto, lhe deu uma camisa florida, igual às que os turistas dos EUA então utilizavam quando visitavam países solarengos.
Tomé Bárbara, sempre bem-disposto, chegava mesmo a organizar jantaradas após os crimes. Numa ocasião em que já era seguido pela PJ terá, acompanhado de Faustino, entrado num restaurante do Algarve onde se fez passar por turista inglês, passando todo o tempo a gabar os carapaus alimados, uma especialidade culinária da região.
O companheiro, corpulento e ágil, conduzia com pé pesado (Barba Azul nunca soube guiar um automóvel, e quando o tentou, acabou por bater, conforme conta Faustino no seu livro Vida e Mortes de Faustino Cavaco), e não tinha pejo em empunhar e disparar armas de fogo.
Juntos terão assaltado mais de uma dezena de bancos, desde o Algarve a Lisboa. Era o tempo em que não havia aberturas retardadas nem alarmes. O tempo em que uma arma apontada a um bancário fazia com que este abrisse os "burros" ou "recalcitrantes", nomes dados aos cofres, sem que houvesse grandes preocupações com o tempo gasto no assalto.
Faustino vive hoje no Algarve, depois de ter sido solto em 2000. Antes, já após todo o grupo ter sido preso, evadira-se de Pinheiro da Cruz com cinco outros condenados. Uma fuga sangrenta, onde os seus disparos tiraram a vida a três guardas prisionais.
Antes destes dois homens, sem contar com os assaltos então atribuídos às FP-25, um outro assaltante de bancos ganhou fama. Chamava-se Jerónimo. Era quase um "Narciso", uma vez que raramente se relacionava com outros homens para cometer os crimes. No entanto, em diversas ocasiões, utilizou mulheres como comparsas.
Jerónimo escolhia a dependência a assaltar. Procurava bancos afastados de postos policiais e, regra geral, actuava depois de estes encerrarem. A sua táctica era arrojada para a época: as duas mulheres que o auxiliavam surgiam de batas, vassouras e baldes a bater à porta do alvo, como se se tratasse de mulheres que ali iam fazer a limpeza.
Despreocupados, os bancários franqueavam a entrada às senhoras, acto que era aproveitado por Jerónimo para, de pistola em punho, também entrar. Foi desse modo que assaltou várias dependências.
Até que numa tarde a sorte deixou de o acompanhar. No Olival Basto, às portas de Lisboa, um polícia que passava junto ao banco que estava a ser assaltado apercebeu-se do crime. Aguardou no exterior que o grupo saísse. Jerónimo, que andava sempre armado, não se quis entregar e, quando fez questão de responder a tiro à tentativa de captura, acabou mortalmente baleado.