Câmara de Aveiro desiste do Museu da República já pré-inaugurado e devolve importante acervo

António Pedro Vicente recebeu de volta
o importante conjunto
de documentos

a Um importante acervo de material de propaganda da Primeira República (1910-1926) foi devolvido pela Câmara de Aveiro a António Pedro Vicente, que, depois de se dedicar à sua recolha e aquisição, o doou àquele município para que constituísse o esteio principal de um museu sobre a República.Esta devolução põe fim a 14 anos de negociações entre a câmara e António Pedro Vicente, que com esta doação pretendia ver reconhecida na terra onde nasceu a figura de democrata e lutador antifascista de seu pai, Arlindo Vicente, possível candidato que desistiu e apoiou Humberto Delgado, nas eleições presidenciais de 1958.
António Pedro Vicente não quis prestar declarações ao PÚBLICO sobre estas longas negociações com três presidências de câmara diversas (começou em 1994, com o autarca Girão Pereira). Agora, já sob a presidência de Élio Maia, o vereador responsável pela Cultura, Miguel Capão Filipe, optou por anular as anteriores decisões e devolver o acervo documental.
Surpreendendo os aveirenses, que tinham já assistido a uma pré-inauguração do Museu da República num edifício adquirido pela autarquia para o efeito, a câmara, presidida por Élio Maia, do PSD, voltou ao notário para desfazer o acordo que fora assinado em 2002. E devolveu a António Pedro Vieira um património que é classificado por especialistas como a maior colecção de documentos sobre a vida política e a propaganda partidária da Primeira República, ombreando, segundo uns, superando segundo outros, a colecção do falecido historiador Oliveira Marques. O museu tinha já como comissário indicado o historiador Luís Reis Torgal.
O vereador da Cultura, Miguel Capão Filipe, assume, em declarações ao PÚBLICO, a responsabilidade pela decisão. Uma responsabilidade que é legitimada pelas declarações do presidente da câmara, Élio Maia. "A pessoa que tem assumido todo o processo é o doutor Miguel Capão Filipe, não terei nada a acrescentar ou a tirar às explicações que ele der e ao que ele diga sobre a forma como o assunto foi analisado."
Falta de dinheiro
Já Capão Filipe frisa que a decisão foi tomada por um motivo: falta de dinheiro. "Chegámos à conclusão que o museu não seria feito porque o município tem dificuldades financeiras e o museu precisava de tecnologia e de suportes informáticos e virtuais que representavam investimentos impossíveis para a câmara." E "se não se realizaram nos quatro anos antes, desde a assinatura do protocolo, não se realizariam nos quatro anos seguintes", afirma Capão Filipe, que remata: "O professor até agradeceu porque não andámos a adiar."
Por outro lado, Capão Filipe explica que "o município tinha de completar um conceito de museu municipal em rede [o imóvel adquirido para o Museu da República faz parte desta rede], usando vários edifícios históricos, que, somados, formam um museu".
Mas garante que a câmara continua com a intenção de tratar a temática da República no museu municipal, assim como as figuras de aveirenses que se destacaram na política, dedicando, por exemplo, "uma ou duas salas a figuras como Arlindo Vicente ou José Estêvão".
Capão Filipe garante também que a câmara assumiu "com a família de Arlindo Vicente a realização de exposições temporárias sobre a personalidade". Há ainda "a hipótese de ser criado um fundo documental Arlindo Vicente". E o nome de Arlindo Vicente será atribuído a uma rua de Aveiro. Igualmente a temática da República será exposta "de forma temporária".
Já sobre as críticas de que a decisão de não fazer um museu da República tinha sido motivada pelo facto de ser monárquico, Capão Filipe frisa que foi uma decisão de "reunião da câmara onde não houve votos contra". Além disso, sublinha que, "qualquer sensibilidade política tem orgulho na história de Aveiro". E garante: "Independentemente das sensibilidades políticas, Aveiro sempre esteve do lado da razão, do lado da liberdade."

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