A prova em que todos querem participar
De grandes pilotos, como Jacky Ickx, a estrelas de cinema, como Paul Newman, muitos nomes famosos passaram por Le Mans
Le Mans é uma pequena cidade francesa (perto de 150 mil habitantes) conhecida em todo o mundo. E a razão é muito simples: tem a mais famosa prova de resistência do automobilismo mundial. As 24 Horas de Le Mans foram criadas em 1923 e desde então foram atraindo as atenções dos fãs dos automóveis. "Dentro do seu género, é a corrida mais importante", conta Manuel Mello Breyner, um dos portugueses que já correram no circuito de Sarthe, recordando o fascínio antigo por esta corrida: "Lembro--me de que há muitos anos Le Mans era transmitido pela televisão espanhola. Eu pegava no meu carro e ia até Elvas, onde, em cafés que sintonizavam a TV espanhola, podia ver a partida e a parte da prova que eles transmitiam". E a atracção por Le Mans não é um exclusivo dos portugueses. Grandes pilotos não resistiram a experimentar as 24 Horas, incluindo vários campeões mundiais de Fórmula 1, como Juan Manuel Fangio, Jim Clark, Jackie Stewart, Keke Rosberg, Nélson Piquet e Michael Schumacher, embora poucos tenham vencido. Mike Hawthorn, Phil Hill, Graham Hill e Jochen Rindt foram os quatro que conseguiram juntar no palmarés vitórias no Mundial de Fórmula 1 e nas 24 Horas. E nem mesmo o actual mago dos ralis, Sébastien Loeb, faltou à chamada - desistiu em 2005 e foi segundo em 2006. Schlesser, o homem do Dakar, também por lá passou. As razões desta atracção são fáceis de entender. Breyner explica: "É uma prova em que se anda muito depressa, apesar de ser uma competição de resistência. O circuito é uma maravilha, porque já não há pistas com 13 quilómetros, e é algo que todos gostamos de ter no palmarés, especialmente os que já passaram pela Fórmula 1 e por Indianápolis". Uma das imagens de marca de Le Mans foi, durante muito tempo, a partida. Com os carros alinhados na diagonal, os pilotos corriam em direcção aos automóveis e arrancavam para a prova. A "partida à Le Mans" foi utilizada pela última vez em 1969. "Ainda bem que a partida é lançada, senão ninguém punha os cintos de segurança", diz Pedro Lamy. As razões de segurança estiveram precisamente na origem desta mudança. Em 1970, os carros ainda ficaram alinhados em espinha, embora com os pilotos já sentados ao volante, mas depois disso a partida foi sempre lançada. A segurança, aliás, foi sempre uma das grandes preocupações da organização da prova, assegurada pelo Automobile Club de l"Ouest (ACO). Especialmente depois da tragédia de 11 de Junho de 1955, naquele que foi o pior acidente da história do automobilismo (foto). O Mercedes de Pierre Levegh embateu no Austin-Healey de Lance Macklin e voou para as bancadas. Morreram 77 pessoas (algumas fontes contabilizam 78) e o ACO resolveu fazer obras no circuito. Foi a quarta versão da pista, que ainda hoje mantém uma parte do antigo circuito Bugatti. Na edição deste ano, os pilotos experimentam a 14ª versão do circuito, já que a curva Tetre-Rouge foi ligeiramente redesenhada, alterando o perímetro da pista de 13,650 para 13,629 quilómetros. Outro momento marcante da segurança em Le Mans aconteceu há menos de uma década. Foi em 1999. A Mercedes (foto) apresentou-se com três carros, um deles conduzido por Pedro Lamy. Na segunda sessão de treinos, o Mercedes CLR número 4 de Mark Webber levantou voo, incidente que se repetiria no warm up. A Mercedes ainda participou na corrida, mas na quinta hora de prova o CLR número 6, conduzido por Peter Dumbreck, entrou também em voo. A marca alemã retirou os seus carros de prova. Para o mito das 24 Horas contribuíram também o cinema e a banda desenhada. "Começámos a conhecer esta prova através da BD do Michel Vaillant", conta Manuel Mello Breyner. Uma ligação reforçada em 2002, ano em que parte do filme Michel Vaillant (argumento de Luc Besson) foi filmada em plena prova. O verdadeiro filme de culto sobre Le Mans é mais antigo (197) e integrou imagens da edição de 1970. Le Mans, com Steve McQueen no papel principal ao volante de um Porsche 917 que hoje estará na posse do comediante Jerry Seinfeld, preencheu o imaginário dos amantes da velocidade. E apesar de ter deixado uma frase famosa - "As corridas são a vida. Tudo o que acontece antes e depois é apenas espera" -, o que mais ficou na memória foi o facto de os primeiros 37 minutos do filme não terem diálogos. Steve McQueen, porém, nunca correu em Le Mans, ao contrário do compatriota e colega de profissão Paul Newman (foto). O actor participou em 1979 e ficou em segundo lugar, com um Porsche 935, ao lado do milionário Dick Barbour e do alemão Rolf Stommelen. Hugo Daniel Sousa