Um modelo original e muitas cópias
a Desde 2004 que a exposição Body Worlds viaja pelos EUA e pelo Canadá. Foi criada pelo anatomista alemão Gunther von Hagens, que em 1977 inventou uma técnica de preservação de cadáveres que baptizou com o nome de "plastinação". Neste momento, encontra-se em Dallas, no Texas.As imitações da exposição original de Von Hagens começam pelos seus descendentes directos, também da sua autoria. A Body Worlds já se desdobrou por duas vezes, em 2005 e 2006, dando origem respectivamente à Body Worlds 2 (em trânsito entre Chicago e Montreal) e à Body Worlds 3 (em exibição em Phoenix, no Arizona). Cada uma destas três exposições, que conjuntamente já acolheram mais de 20 milhões de visitantes, tem a sua especificidade. "A primeira inspira-se nos anatomistas e nos desenhos anatómicos do Renascimento", informa o site oficial www.bodyworlds.com; a segunda é mais "dinâmica", "desportiva"; a terceira é uma alusão à Idade Média e também um regresso ao Renascimento.
O sucesso financeiro deste tipo de exposição rapidamente criou adeptos. Um deles é precisamente a empresa norte-americana Premier Exhibitions, que agora traz a Portugal a mostra O Corpo Humano Como Nunca o Viu (no original, Bodies... The Exhibition). Mas há outras: The Universe Within (O Universo Interior), também de origem norte-americana; Body Exploration em Taiwan; ou The Amazing Human Body, na Austrália, para citar algumas. Segundo os responsáveis da exposição original, existem ao todo, neste momento, 19 exposições emuladoras.
A exposição original foi alvo de controvérsias. Houve quem argumentasse que o facto de serem assim expostos privava os cadáveres da sua dignidade; houve os que se interrogaram sobre a proveniência dos corpos e sobre a questão de saber se as pessoas tinham ou não dado, em vida, o seu consentimento informado com vista a esta utilização dos seus restos mortais. Foi aliás na sequência de tentativas das autoridades locais para proibirem a sua exposição em cidades como Hamburgo e Munique que Von Hagens decidiu, em 2004, fazer emigrar a sua mostra para a América do Norte.
Litígios e controvérsias
Houve também quem acusasse Von Hagens de sensacionalismo. Mas ele (tal como as outras empresas) defende que a sua exposição tem sobretudo um objectivo pedagógico e que se destina a fazer-nos perceber como funciona o nosso corpo, bem como a importância de ter um estilo de vida saudável para o conservar de boa saúde ao longo da vida.
Quanto à proveniência dos corpos e ao consentimento dos defuntos, Von Hagens chegou a ser acusado, em inícios de 2004 pela revista Der Spiegel, de utilizar os cadáveres de reclusos chineses que tinham sido executados. O médico processou a publicação, que neste momento se encontra proibida de sequer aludir a este tipo de práticas, "sob pena de ter de pagar ao dr. Von Hagens uma multa de 250.000 euros", lê-se no site oficial da exposição original.
Todos os corpos exibidos nas suas Body Worlds, afirma Von Hagens, foram objecto de doação em vida pelas pessoas ao Instituto de Plastinação, em Heidelberg, por ele fundado em 1993. Actualmente, o instituto tem um rol de mais de 7000 doadores. Em 2005, dois comités de ética, na Califórnia e em Chicago, confirmaram que os corpos das exposições da série Body Worlds tinham efectivamente sido doados pelos própios em vida - o que não é o caso da exposição que agora é inaugurada em Lisboa.
Quando surgiram as "exposições-clones", começaram os litígios entre Von Hagens e as empresas que gerem essas mostras. Não apenas devido à utilização da técnica de plastinação por ele inventada há 30 anos, mas também porque os especímenes eram apresentados, nessas exposições, de forma muito semelhante às das exposições da série Body Worlds. Von Hagens processou a Premier Exhibitions, responsável pela mostra de Lisboa, de violação de direitos de autor.
"Actualmente, não há nenhum processo deste tipo em curso", disse ao PÚBLICO uma porta-voz da Body Worlds, explicando que "o dr. Von Hagens acha que as cópias da sua exposição não representam ameaça nenhuma e que o público as rejeitará por razões éticas, optando por não ver corpos que nunca deram o seu consentimento legal para serem publicamente expostos [corpos não reclamados provenientes da China]. As cópias são meras exibições de cadáveres preparados com os seus métodos experimentais de 30 anos atrás, e são de baixa qualidade porque aceleram o processo de plastinação para conseguir expor rapidamente os seus especímenes".
As polémicas não têm impedido as exposições de continuarem a exibir-se, a atrair multidões e a gerar lucros.