O Ruca e o Noddy não têm poderes nem nos salvam dos maus

Os heróis servem para combater os maus. Por isso, há crianças que ainda elegem o Super-Homem
ou o Batman como
personagens favoritos

a Quando a Bruna, três anos, admite que o seu herói preferido é o Noddy, Pedro, da mesma idade, não se contém. "Noddyyyy!", berra exaltado, saltando da cama onde, até há poucos minutos, esteve a dormir a sesta da tarde. Junta-se ao grupo sentado numa mesa redonda no infantário Pinheirinho Verde, em Corroios, que responde sem hesitações às perguntas sobre os heróis favoritos. "Gosto do Turbulento e da roupa do Noddy", explica, já mais sossegado. André, que também acabou de acordar, assistiu com os pais ao espectáculo ao vivo e traz vestida uma camisola estampada com o personagem criado pela escritora britânica Enid Blyton. "Gosto dele", assume, sem mais explicações, como se fosse lógico, como se qualquer pessoa com o mínimo de inteligência só pudesse gostar do boneco de chapéu pontiagudo. O David, quatro anos, até nem elege o Noddy como favorito mas também foi com os pais ver o musical. Do tempo que passou sentado na cadeira só se lembra "das coisinhas com luzes". "Eu gosto mais dos Pokémons porque têm ataques de poder", atira. A eleição dos melhores heróis não é consensual. Tomás, um ano mais velho, diz mesmo que não gosta nem do Noddy, nem do Ruca "porque não têm poderes". É que os heróis precisam de características mágicas para salvar os inocentes dos maus.
Noutra sala, um grupo de crianças com cinco anos põe em questão a popularidade intocável dos simpáticos personagens. "Não gosto nada do Ruca. Ele não tem cabelo mas já é grande...", questiona Miguel com ar intrigado. Os Action Men, musculados e de ar rígido, enchem-lhe as medidas. "Enfrentam os maus. O Noddy e o Ruca não!", explica. Diogo enumera uma lista quase interminável de favoritos: Super-Homem, Batman, Homem-Aranha, Sonic (a mascote do jogo de computador da Sega), Power Rangers. O grupo de crianças que o rodeiam imita as suas preferências. "O Batman salva as pessoas e mata os bandidos", diz o Miguel. Gonçalo reforça que os heróis "salvam as pessoas todas dos maus" e garante que ele, graças ao fato de Carnaval do Batman que a mãe lhe comprou, também é capaz de fazer o mesmo. "Tenho uma coisa na roupa para ter força", explica, sem desmanchar a pose séria, como se naquele preciso instante estivesse vestido com o fato negro e asas de morcego. A Beatriz, faladora e irrequieta, elege o Sonic porque corre rapidamente, mas acrescenta a Minie e a Barbie à lista. E o Ruca e o Noddy? "Sim! Esses também gosto", exclama, rasgando um sorriso. Gonçalo insiste em falar, espeta o dedo no ar e conta que na escola há jogos com eles. "O Noddy ajuda os amigos e dá-lhes presentes", salienta. As meninas da sala concordam. "Faz coisas bem feitas", garante Beatriz. Já a Inês é fã da Floribella, daquelas que se vestiam de igual quando a telenovela da SIC estava no ar. Nessa altura, era impossível fugir ao fenómeno no infantário.
"Traziam a roupa vestida, houve uma onda de Floribellas. O cartaz que está na sala foram eles que insistiram em colocar", conta Helena Balseiro, educadora de infância. A escola organiza saídas ao teatro, mas nunca aos musicais dos heróis televisivos. "Quase todos os pais levaram os filhos ao espectáculo do Ruca e do Noddy. Nós vamos onde as crianças não costumam ir: o campo, por exemplo", continua. De repente, o Pedro, de três anos, lembra-se do Bob, o Construtor. E, para garantir que ninguém se esquece dele, canta bem alto o genérico: "Eu sou o Bob, construtor; eu sou o Bob, trabalhador!"

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