Henry Thomas ainda é o miúdo do ET
Há um rapaz a autografar a edição especial de ET - O Extraterrestre na Baixa do Porto. 25 anos depois, não o reconhecemos. Mas ele continua a ser o Elliot (quem lhe dera já ser outra coisa)
a Henry Thomas tem idade para ser pai dele - dele, do Henry Thomas que conhecemos (e que quisemos ser: onze anos, um casaco vermelho, uma bicicleta, um extraterrestre, a única coisa que se podia querer mais era a lua, e até isso ele tinha) - e podia de facto ser pai dele, se não continuasse, aos 35 anos, a ser o miúdo que andou de bicicleta com o ET. No imaginário colectivo - e, para todos os efeitos, na vida real, apesar dos encontros casuais, sem ofensa, que teve com Milos Forman em Valmont, Edward Zwick em Lendas de Paixão e Martin Scorsese em Gangs de Nova Iorque - ele nunca cresceu. Ainda é o Elliot: 25 anos depois, pedem-lhe autógrafos na edição especial para coleccionadores de ET - O Extraterrestre (o Fantasporto fez outra coisa: deu-lhe um prémio de carreira), e ele obedece (é mais forte do que ele).Perguntamos-lhe o que correu mal -Sam Shepard e Sissy Spacek aos dez anos (Raggedy Man), Spielberg aos onze, uma não-carreira à base de telefilmes e produções de baixo orçamento aos 35 -, como se ele soubesse. "Alguma coisa correu mal, mas tudo depende da maneira como olhas para as coisas. Eu não estou propriamente a ressacar o insucesso dos últimos anos. Olho para as coisas de outra maneira: sempre me consegui sustentar como actor, sempre tive trabalho, isso chega-me. Às vezes penso que a minha vida teria sido completamente diferente se tivesse tido uma infância normal - mas também não teria sido a minha vida. Não conheço outra. E não fico acordado à noite a pensar que cometi um erro terrível", diz.
É uma parte da verdade. A outra parte é esta: nada disto é o que ele imaginava. "Não foi difícil começar no ET. Difícil foi continuar depois do ET. Foi difícil sobretudo quando deixei de ser criança, quando mudei. Em Hollywood é assim: tu mudas e as pessoas ficam consternadas. Tem sido uma luta". Ganhou algumas, perdeu outras: passa anos desaparecido em combate (no anonimato da série B, dos telefilmes, das produções independentes), e depois aparece (em papéis secundários, sim, mas aparece). "Nos últimos cinco, seis anos tornou-se quase impossível trabalhar em filmes maiores. Parece que há 12 pessoas no cinema americano que estão sempre a trabalhar - e eu não sou uma delas. Estou constantemente a fazer pequenos filmes, muitos nunca chegam a ser distribuídos. 80 por cento dos filmes que fiz nos últimos seis anos nunca foram vistos por ninguém, quando muito passaram num ou dois festivais de cinema. Mas quando tenho pena de mim, penso: ah, mas eu trabalhei com aqueles tipos [Spielberg, Forman, Scorsese], não é assim tão mau", explicou anteontem numa conferência de imprensa em que voltou a ser uma estrela (flashes, autógrafos, um prémio). Na vida real, não podia estar mais longe disso: "Filmamos o Gangs de Nova Iorque na Cinecittà, em Roma, e tínhamos 800 figurantes todas as manhãs. O meu camarim era mesmo junto à porta por onde eles entravam - isso dá uma ideia do meu lugar no ranking do Martin Scorsese".
Posteridade não, obrigado
Mas não dá uma ideia do lugar de Martin Scorsese no ranking dele: "É o meu realizador favorito, não há outro que perceba tão bem os actores. É muito intuitivo, percebe instintivamente onde é que está a cena. E adora estar no set, ao contrário de muitos realizadores". Tem outros heróis pessoais (Sofia Coppola, Michael Hanneke), mas também tem uma vida: uma filha de dois anos (ainda não viu o ET) e um álbum para gravar (e enquanto isso: www.myspace.com/henrythomasmusic). "Há alturas em que penso: é isto, acabou-se. Mas eu não perco muito com o que quer que seja, além daquilo que estou a fazer no momento. É um desperdício pensar: alguma vez serei famoso, alguma vez receberei um prémio? Dar o meu melhor em cada papel é muito mais importante do que pensar na posteridade".
Aconteça o que acontecer, ele terá sempre o ET (e, com o ET, os seus 15 minutos de fama): "Nenhum de nós tinha noção da importância do filme. Olho para trás, para esses dias de rodagem, e só me lembro de coisas mínimas: o dia em que caí da bicicleta, o dia do melhor pequeno-almoço. Nada de monumental. Sim, houve uma fase em que tive problemas com isto de não passar do miúdo do ET. Mas as pessoas ainda se lembram de uma coisa que eu fiz há 25 anos - e isso é bom".