Caretos transmontanos e desenhos de Almada no Museu do Abade de Baçal
Edifício de Bragança reabre hoje as portas, com um acervo que inclui pintura, faiança e as colecções doadas pelo seu patrono
Caretos, máscaras e mascarados típicos da cultura transmontana, documentando as Festas dos Rapazes, rituais do ciclo de Inverno no Nordeste Transmontano, vão ser mostrados no novo espaço polivalente do Museu do Abade de Baçal, em Bragança, que hoje reabre ao público um ano depois de ter sido encerrado para obras de renovação.A exposição Rituais de Inverno com Máscaras testemunha o projecto de recolha etnográfica coordenado por Benjamim Pereira, que integrou o grupo fundador do Museu Nacional de Etnologia. No novo espaço será também exibida a exposição Caretos II, de José Vieira, pintor com raízes transmontanas, que acrescenta aos quadros alguns registos em filme de diversas manifestações culturais que o próprio recolheu na região desde 1982.
Outro motivo de atracção para o museu agora reinaugurado é uma importante colecção de desenhos de Almada Negreiros. "Parte desses desenhos estavam guardados, encontrámo-los recentemente, foram restaurados e, como são muitos (cerca de 70), vão rodando na exposição permanente", explicou ontem o director do museu, Neto Jacob. Neste espaço, as obras de Almada vão ser expostas com quadros de outros pintores portugueses, como Silva Porto, Marques de Oliveira, Veloso Salgado, Abel Salazar e José Malhoa.
Mas a sala com a exposição permanente do Museu do Abade de Baçal vai exibir ainda novas peças de faiança grande, da colecção doada por António Cagigal, na sua maioria dos séculos XVIII e XIX (das fábricas de Coimbra, Porto, Gaia e Viana do Castelo).
O acervo do museu de Bragança - que integra a rede do Instituto Português de Museus (IPM) - é agora exposto num ambiente completamente renovado, com nova iluminação e climatização, que resultou da terceira fase das obras de remodelação e ampliação do edifício. As obras custaram um milhão de euros, foram financiadas pelo IPM e comparticipadas a 75 por cento por fundos comunitários.
"Basicamente, foi aproveitada a ala nascente do edifício, que era o antigo paço episcopal, e a Casa de José Faria, que já pertencia ao museu, mas não estava aproveitada", explicou o director. A reabertura do espaço acontece com seis meses de atraso em relação aos prazos inicialmente previstos. Neto Jacob admite que houve atrasos no decorrer do processo, "desde a fase de projectos até à sua concretização". Mas recorda que desde os anos 1940 que não era feita uma "releitura" do espaço de exposições.
O director do IPM, Manuel Bairrão Oleiro, diz que o Museu do Abade de Baçal "é um dos mais bem colocados para o desenvolvimento das temáticas regionais". E acrescenta que, estando ele colocado numa das portas de entrada do país, "tem uma capacidade especial para conquistar público estrangeiro, principalmente o espanhol, que assim pode logo contactar com a especificidade da cultura portuguesa"
Antes de encerrar, o museu registava uma média de 10 mil visitantes por ano, número que Neto Jacob pretende "aumentar significativamente", atendendo à melhoria das condições de exposição e à capacidade, agora adquirida, de dar uma nova dinâmica a esta infra-estrutura cultural.
No entanto, o museu vai ter de competir com uma série de equipamentos já existentes ou em vias de serem inaugurados em Bragança - uma cidade com menos de 30 mil habitantes que possui um museu militar (com 50 mil visitantes/ano), teatro municipal, centro cultural e Casa da Música, e vai ter também um Museu Ibérico da Máscara (a inauguração está prevista para Janeiro) e um centro de arte contemporânea (a abrir também em 2007).
"A nível cultural, a oferta pode ser excessiva, se atendermos ao mercado local", admite o director, mas lembra que "grande parte dos visitantes vêm de fora". No entanto, Neto Jacob receia que a multiplicação de equipamentos resulte numa multiplicação dos custos e que, no final, "falte dinheiro para desenvolver iniciativas com impacto para a população".
Francisco Manuel Alves (1865-1947), assim se chamava o sacerdote, arqueólogo e historiador conhecido por abade de Baçal. Dedicou parte da sua vida à investigação arqueológica e histórica da região transmontana. Foi nomeado em 1925 director-conservador do Museu Regional de Bragança, que desde 1935 ostenta o seu nome. A sua obra principal é constituída pelos 11 volumes das Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, começados em 1909 e terminadas em 1947. Como legados ao museu, o abade deixou, essencialmente, os resultados e testemunhos das suas investigações etnográficas, arqueológicas e epigráficas.