Cascais deita por terra o projecto de torre na marina
Presidente da câmara quer intervir de forma "articulada e coerente" no porto de recreio
e na Cidadela
O projecto da torre de 100 metros destinada a hotel na marina de Cascais não vai sair do papel. O presidente da autarquia, António Capucho, anunciou ontem que já foi comunicado à concessionária do porto de recreio que não será viabilizado "qualquer edifício singular desenvolvido em altura".A Marcascais apresentou à autarquia um projecto de requalificação da marina que previa o aumento das actuais áreas comerciais e a construção de apartamentos turísticos. A proposta, do gabinete de arquitectura Promontório, incluía uma torre revestida a vidro com três dezenas de pisos destinada a uma unidade hoteleira, a construir à entrada do porto de recreio.
O presidente da câmara, António Capucho, explicou ontem ao PÚBLICO que informou a Marcascais, em 23 deste mês, de que não é viável a concretização da torre e disse que a concessionária já se encontra a reformular o projecto. O autarca reconheceu que foi "sensível às críticas apontadas à construção da torre", entre as quais a petição on-line com 1647 subscritores que ontem lhe foi entregue, mas também manifestadas por várias forças partidárias e autarcas. António Capucho não partilha das opiniões contrárias às arrojadas linhas arquitectónicas do edifício, cujo enquadramento considera "positivo", mas admitiu que na decisão também pesou a eventual dificuldade da concretização do projecto "no plano técnico e da engenharia", dada a sensibilidade da zona para onde a torre estava projectada.
O autarca recebeu ontem uma petição contra a torre, subscrita por 1657 pessoas, lançada através da Internet por João Nuno Barbosa. O apelo manifestava preocupação pelo "impacto no meio e na paisagem" da construção da "torre da luz", como era designada pelos promotores. A estrutura, notava a petição, "resultará numa nova obstrução às vistas, que, pela sua altura e proximidade da vila, se tornará obsessiva e esmagadora".
O documento chegou a ser alvo de uma "brincadeira" com a inclusão de alegadas assinaturas de António Capucho, José Sócrates e Aníbal Cavaco Silva, mas esses e outros nomes que suscitaram dúvidas foram depois removidos. Num questionário promovido pelo blogue acerca da torre de 100 metros na marina, 49 votantes escolheram a opção de que se tratava de "uma aberração", contra 43 votos de que representava "um ícone [para o] futuro".
"Vitória da cidadania"Paulo Ferrero, do movimento Cidadania Cascais, congratulou-se com a decisão do presidente da câmara de travar a construção da torre, considerando que "é um exemplo a seguir". No blogue, vai mais longe, ao afirmar que se trata de "uma vitória da cidadania cascalense, que já muitos duvidavam que ainda existisse, depois dos crimes ambientais, paisagísticos, urbanísticos e de pura fraude por que Cascais passou noutros tempos".
António Capucho não escondeu que foi receptivo à petição on-line, tal como às outras diferentes formas de expressão, por entender que os subscritores de um apelo deste género estarão tendencialmente mais informados sobre o que assinam do que os que aceitam subscrever um abaixo-assinado no meio da rua. Seja como for, o autarca social-democrata salientou que a câmara pretende "intervir de forma articulada e coerente" na marina e na Cidadela, espaço para onde foi lançado um concurso público para a sua concessão.
O júri do concurso decidiu não adjudicar o aproveitamento turístico e comercial do antigo recinto militar ao único concorrente, por este ter apresentado uma proposta que não cumpria o caderno de encargos. A autarquia pondera agora avançar com uma de várias soluções para a requalificação do espaço: novo concurso; abertura a privados do capital da empresa municipal Fortaleza de Cascais, ou constituição de uma sociedade de desenvolvimento municipal.
Enquanto isso, a Cidadela não pode ter "qualquer intervenção de fundo" até Julho de 2007, pois será utilizada para eventos relacionados com o Campeonato do Mundo de Vela, que levará a Cascais mais de mil embarcações.
"Isto para nós é uma surpresa. Não acho que tenha existido uma contestação pública tão significativa", comentou, por seu lado, Pedro Garcia, da Marcascais, confrontado com a recusa da torre que defendia como um "farol" do desenvolvimento turístico da zona. O responsável da concessionária respeita a decisão camarária, mas contrapõe que a solução, além de ter conseguido aprovação do Instituto Português do Património Arquitectónico, era tecnicamente viável. E concorda que "a câmara seja sensível à necessidade de requalificar a marina e dar uma vocação à Cidadela".