O debate de Manuel II com Haci Bayram-I Veli

Foi um livro de Adel-Theodore Khoury, que edita o diálogo do imperador Manuel II Paleólogo com um persa erudito, que esteve na base da polémica gerada por uma passagem do discurso do Papa dia 12, em Ratisbona (Alemanha). O interlocutor do imperador de Constantinopla poderá ser Haci Bayram-I Veli, religioso muçulmano, de acordo com um artigo de Ali Ihasan Aydin no jornal turco Zaman. Na sétima controvérsia, em que Manuel II e Bayram-I Veli se tentam convencer um ao outro da superior racionalidade de cada uma das religiões - cristianismo e islão -, o imperador utiliza a frase que esteve na origem da polémica dos últimos 15 dias: "Mostra-me então o que Maomé trouxe de novo. Não encontrarás senão coisas más e desumanas, tal como o mandamento de defender pela espada a fé que ele pregava - e isto é irracional."
O que o Papa não citou foi a resposta do muçulmano. De acordo com o texto do Zaman, que cita o livro de Khoury, editado em 1966, Bayram-I Veli respondeu que os muçulmanos acreditam em Moisés e Jesus. Só que as religiões trazidas por esses profetas "foram distorcidas mais tarde, mostrando que a actual irracionalidade estava na fé de Manuel".
Khoury diz no livro, segundo o texto do Zaman, que ambos os interlocutores "permaneceram fechados na sua própria doutrina", rejeitando categoricamente os argumentos da outra parte. O diálogo converteu-se rapidamente num monólogo, nota o autor.
No International Herald Tribune, Erwan Lagadec chama a atenção para outro pormenor: o Papa cita um imperador de Constantinopla, o penúltimo imperador bizantino. Se fosse século e meio antes, o mesmo Manuel II, ortodoxo, poderia ter dito o mesmo que disse ao interlocutor muçulmano sobre os cruzados latinos que também devastaram a cidade.
Na altura em que o diálogo da polémica se trava, Constantinopla está cercada - e acabará por sucumbir aos turcos meio século depois. Manuel II é já um espectador do estertor do império. Para trás dele, na sua cidade, a história registava séculos de conflito entre o cristianismo e o islão, e entre o catolicismo de Roma e a ortodoxia de Constantinopla. A.M.

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