JOSEPH KONY O HOMEM MAIS PERSEGUIDO DE ÁFRICA DEIXOU DE SER INVISÍVEL
A figura mítica do Exército de Libertação do Senhor, grupo de guerrilha no Uganda, apareceu em público depois de propor um cessar-fogo incondicional. Por Matthew Green, em Nabanga (fronteira do Sudão com a República Democrática do Congo)
Para um dirigente rebelde cujo estatuto no Norte do Uganda se aproxima mais de um mito do que de um homem, Joseph Kony parecia surpreendentemente nervoso. Esta era, afinal de contas, a sua primeira conferência de imprensa. Envolto na obscuridade desde que há 20 anos iniciou a sua ascensão, a figura pública de Kony tem sido definida quase inteiramente em termos das chacinas, mutilações e raptos cometidos pelo seu Exército da Resistência do Senhor (LRA).
Tão silencioso tem estado, tão invisível, que alguns se têm interrogado sobre se Kony existia ou não. Consciente de que as relações públicas nunca tinham sido o ponto forte do seu líder, os rebeldes estão a fazer o melhor que podem para o apresentar como um libertador, nas conversações de paz que em Julho principiaram na capital do Sul do Sudão, Juba.
Procurado pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) por acusação de crimes de guerra, ninguém esperava que o próprio Kony aparecesse em público. Mas na semana passada este homem de 43 anos apareceu numa clareira da fronteira do Sudão com a República Democrática do Congo (RDC, ex-Zaire) de camisa e calças brancas, sapatos pretos e um lenço de flanela azul a limpar a testa. Não foi tanto o que disse que se notou, mas sim o seu aspecto.
De olhos bem abertos, assustado, intenso: Kony está claramente muito mais à vontade na selva do que perante as câmaras. Para os jornalistas enviados ao seu encontro, a sua aparência compensou uma semana de espera. Juntando-se a uma equipa de paz de umas 200 pessoas, na fronteira com a RDC, onde os rebeldes do LRA têm agora a sua base, os jornalistas tinham tomado um avião de carga Antonov em Juba antes de chegarem a Maridi para uma viagem de nove horas até ao posto fronteiriço de Nabanga.
Dias passados na aldeia de cabanas, árvores de teca e pouco mais, enquanto mendigávamos uma entrevista. Fomos convidados pelo "parlamento" do LRA - uma sala com tecto de colmo - a percorrer durante quase uma hora a floresta congolesa, onde pela primeira vez vimos Kony. Percorrendo o mato durante a noite, um grupo de repórteres perdeu-se inevitavelmente perto da fronteira durante cerca de uma hora, o que animou uma espera em grande parte pouco interessante em Nabanga.
Normalmente teria ficado fascinado pelos temidos soldados de Kony, alguns dos quais pareciam ter à volta de 12 anos. No entanto, depois de alguns dias na estrada, a salada de tomate e cebola pareceu mais interessante. Apesar da sua reputação assustadora, os soldados de Kony não conseguiam deixar de esboçar largos sorrisos ao cercarem os fotógrafos para ver a sua imagem em câmaras digitais. Pareceram mais sérios quando o seu chefe surgiu na clareira para se reunir com os medianeiros antes de se sentar numa cadeira de plástico e transmitir uma mensagem extraordinariamente
simples.
"Sou um homem, sou um ser humano, sou Joseph Kony", declarou, parecendo nervoso enquanto as câmaras disparavam. "As palavras que me dizem e que são propaganda ensombram o meu nome, para que não gostem de mim como um ser humano." Afastei-me para noticiar pelo telefone o seu apelo a um cessar-fogo. Quando voltei, tinha desaparecido no mato. Jornalista da Reuters