O actual ministro e o ex-director da PJ
A guerra de argumentos entre Alberto Costa e Santos Cabral só complica a necessária transição pacífica na Judiciária. Não se trata apenas de Alberto Costa confiar na PJ, mas também de esta poder confiar no ministro que a tutela
O actual ministro da Justiça e o ex-director nacional da Polícia Judiciária mantêm, publicamente, uma absurda guerra de números e de argumentos sobre as razões da demissão do segundo, sobre quem se demitiu ou quem foi demitido ou mesmo sobre a eficiência daquela polícia de investigação. As declarações de Alberto Costa na Assembleia da República sobre a eficiência da direcção de Santos Cabral querem basicamente dizer que a corporação era inconsequente nas suas investigações, pelo que tinha uma grande percentagem de casos arquivados e que apenas 18 por cento dos inquéritos seguiam para a acusação. Ineficiência que só se pode atribuir à ex-direcção nacional da PJ ou à falta de meios de que se queixaram Santos Cabral e os dirigentes da associação sindical da polícia, e que, a ser verdade, era da exclusiva responsabilidade do Governo.Alberto Costa não gostou que Santos Cabral tivesse feito um ultimato ao Executivo para ver satisfeitos os seus pedidos de reforço orçamental, uma necessidade para a qual a Direcção-Geral do Tesouro já tinha alertado no início de Março, ao referir que era impossível disponibilizar mais verbas para despesas sem provimento orçamental. A substituição do director da PJ, repetiu-o o ministro, deveu-se ao facto de aquele ter pretendido condicionar a liberdade do Governo com a denúncia de que a corporação estava em ruptura financeira e, portanto, assim pôs em causa a existência de uma relação de confiança. A PJ falava numa redução orçamental de 63 por cento; o Ministério da Justiça em 6,2. A discrepância permite muitas interpretações, muitas dúvidas. Mas ficamos sem saber se a corporação se encontra mesmo em ruptura financeira ou não. E também era desejável que o ministro explicasse, de facto, a que se devia essa falta de eficiência, porque o que disse esta semana entra em total contradição com o resultado do relatório da análise criminológica da PJ divulgado esta semana.
O que diz a PJ é que os seus níveis de operacionalidade são apenas ultrapassados pelos do primeiro semestre do ano em curso, com aparentes resultados históricos em áreas como a do combate ao tráfico de droga (a cocaína apreendida no último ano em Portugal é 18 por cento da totalidade daquele estupefaciente confiscado na Europa) ou da média e grande criminalidade. A instabilidade na Judiciária veio para ficar e cada palavra do ministro só aumenta a suspeita sobre um órgão de investigação que deveria estar acima de qualquer dúvida quanto à sua eficiência ou manipulação política, uma interpretação plausível permitida pela ideia de retirar à PJ o pelouro das relações internacionais com a Europol e a Interpol. A guerra de argumentos entre Alberto Costa e Santos Cabral só serve para aumentar estas dúvidas e colocar mais entraves a uma necessária transição pacífica na Judiciária. Não se trata apenas de Alberto Costa confiar na PJ, mas também de esta poder confiar no ministro que a tutela.