Beatriz Costa "Vedeta mais popular" do teatro de revista morreu há dez anos

Foi a costureira Alice de A Canção de Lisboa (1933) e a lavadeira Gracinda de A Aldeia da Roupa Branca (1939). É assim que a maioria das pessoas lembra Beatriz Costa, a actriz de revista que se deixou seduzir pelo cinema quando ele era ainda mudo e que morreu faz hoje dez anos, em Lisboa. Para a imprensa dos anos 1920 e 30, ela foi "a menina da franja " (imagem que assumiu em 1927), a "princesa do cinema português" (o seu príncipe era Vasco Santana), a "rainha das coristas", a "marca de Lisboa".
Quando morreu, aos 88 anos, Beatriz Costa (1907-1996) estava longe dos palcos há quase quatro décadas, mas continuava presente no imaginário dos portugueses. Os filmes de Cottinelli Telmo e de Chianca de Garcia continuavam a ver-se e a divulgar a imagem popular de uma mulher que, em criança, viveu em casa de Malhoa, foi bordadeira e aprendeu a ler aos 13 anos, sozinha.
"Beatriz Costa foi a vedeta mais popular do teatro ligeiro", diz Vítor Pavão dos Santos, autor da obra Revista à Portuguesa. "Nunca houve uma pessoa tão engraçada como ela no teatro de revista. Tudo o que ela dizia ou cantava saía para a rua, passava a fazer parte da vida das pessoas."
A capacidade "invulgar" de comunicar com o público e a sua espontaneidade ajudaram a fazer de Beatriz Costa um "ícone popular", defende Pavão dos Santos, traçando os pontos altos da vida da actriz: a primeira viagem para o Brasil, em 1924 - "vai como corista e regressa a Portugal como primeira figura"; revistas como Sete e Meio, Fox Trot, O Mexilhão e Isto Agora é Outra Loiça (alusão à chegada de Salazar ao poder); filmes como A Canção de Lisboa.
"Beatriz Costa era muito boa actriz de revista", acrescenta Pavão dos Santos. "Não sei se o seria no teatro sério, porque nunca experimentou, nunca a vimos construir uma personagem daquelas que tivessem de evoluir do princípio ao fim de uma peça. O que ela fazia eram tipos como a saloia, que, aliás, começara por ser, o vendedor do burrié ou o anjinho da procissão."
O número D. Chica e Sr. Pires foi um dos picos de popularidade desta actriz que, tendo nascido na Malveira, a "zona saloia" dos arredores de Lisboa, nunca negou as suas raízes. "Não repudio as minhas origens campestres, até porque Rembrandt também era filho de moleiro", dizia no habitual tom de provocação que marcou os seus seis livros de memórias e viagens, a que passou a dedicar-se quando se retirou dos palcos.
Depois da última revista, Está Bonita a Brincadeira (1960), começou a viajar pelo Mundo, parando em prestigiados festivais de teatro e conhecendo personalidades como Orson Welles, John Ford, Piaf, Dalí e Picasso. Sobre Marlene Dietrich, diria: "Foi minha amiga. Ela cozinhava, eu e a Greta Garbo lavávamos a loiça".
Morreu no quarto 600 do Hotel Tivoli, em Lisboa, onde vivia há quase 50 anos, perto dos "palcos de glória" do Parque Mayer e do Cinema Tivoli, não muito longe da Brasileira, onde tantas vezes se sentou com Almada Negreiros, Vitorino Nemésio e Mário Eloy.
Para esta mulher que lia Dostoievski e Boto ao som de Schubert e dizia preferir o verde às outras cores, apesar de ser daltónica, a vida era uma "brincadeira". "Era, fui e serei sempre uma criança contente", dizia. Os momentos de tristeza eram resolvidos de forma simples: "Quando quero chorar, penso na minha vida sexual. Quando quero rir, também".

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