Ucranianos votam pela primeira vez depois da "Revolução Laranja"
A questão central das eleições parlamentares de hoje não é saber quem ganha, mas que governo de coligação sairá deste escrutínio. O Presidente afirma que serão as "primeiras eleições verdadeiramente livres e democráticas no país". Mas a próxima Rada Suprema não será fácil para Victor Iuschenko
Segundo um inquérito realizado pela Fundação Iniciativa Democrática, o Partido das Regiões, do antigo primeiro-ministro ucraniano, Victor Ianukovitch, conquistará 30,4 por cento dos votos, enquanto o Bloco Nossa Ucrânia, do actual Presidente, Victor Iuschenko, ficará em segundo lugar com 16,9 por cento.
A seguir, de acordo com o mesmo estudo, viria o Bloco de Iulia Timochenko, que tem o nome da ex-primeira-ministra, com 16,9%. Mais abaixo o Partido Socialista (5,4 por cento), o Partido Comunista (3,7 por cento), o Bloco Popular, dirigido por Vladimir Litvin, actual presidente do Parlamento (3,4 por cento dos votos), e o Bloco de Natália Vitrenko, força populista, (chegando aos 3,2 por cento).
Estes dados parecem dar razão ao Presidente ucraniano, Victor Iuschenko, quando afirma que serão as "primeiras eleições verdadeiramente livres e democráticas no país".
Se esses dados se confirmarem, nenhuma força política ucraniana conseguirá a maioria absoluta dos lugares na Rada Suprema, o que obrigará à criação de uma coligação para que seja possível formar governo. As combinações possíveis são numerosas, mas as mais prováveis são duas: o restabelecimento da coligação criada durante a "revolução laranja", que levou à eleição de Iuschenko, ou a coligação das forças políticas dirigidas pelos dois rivais nas presidenciais de 2004, Iuschenko e Ianukovitch.
Stanislav Belkovski, director do Instituto de Estratégia Nacional da Rússia, defende o segundo cenário, considerando que "esta é a única possibilidade de formar um governo estável no país", mas sublinha que esta coligação só será possível com cedências sérias de ambas as partes. Iuschenko, político ocidentalista, renunciará, pelo menos temporariamente, à ideia da adesão do seu país à União Europeia e NATO, e Ianukovitch ao plano de adesão da Ucrânia ao Espaço Económico Único, formado pela Rússia, Cazaquistão e Bielorrússia.
Coligação com Timochenko cada vez mais remotaEsta aliança poderia também atenuar outro dos problemas antigos do país que deverá ser novamente confirmado nestas eleições - a divisão da Ucrânia entre o Sul e o Leste, de um lado, regiões viradas para Moscovo e que apoiam Ianukovitch, e o Centro e Ocidente do país, pró-ocidentais e apoiantes de Iuschenko.
Embora pareça tratar-se de uma coligação contranatura, é um facto que só o acordo entre Iuschenko e Ianukovitch garantiu, a 22 de Setembro do ano passado, o apoio da maioria dos deputados da Rada ao Governo do primeiro-ministro, Iuri Iekhanurov, que o Presidente pretende manter em funções.
Quanto à possibilidade de formação de uma coligação Iuschenko-Timochenko, ela é cada vez mais remota, pois o regresso de Iulia Timochenko à chefia do Governo, porque ela não aceitará um acordo por menos, poderá significar o reavivar de lutas entre clãs económicos e a deterioração das relações com a Rússia.
"Em qualquer dos casos Timochenko não será primeira-ministra. Pode vir a ser Presidente, mas não tem hipóteses de vir a dirigir o Governo. É demasiadamente perigosa", considera Oles Donii, director do Centro de Estudos dos Valores Políticos da Ucrânia.
Poderes no ParlamentoAs batalhas serão ainda mais duras em torno da "reforma política", lei que entrou em vigor no início do ano e que transfere grande parte dos poderes do Presidente para a Rada Suprema, nomeadamente a prerrogativa de nomeação do primeiro-ministro e Governo. Victor Iuschenko assinou-a durante a "revolução laranja" a fim de evitar, como afirmam os seus apoiantes, "uma guerra civil", mas, logo após, exigiu a sua revisão, o que lhe foi negado pelo Parlamento.
Nesta contenda, a próxima Rada não será mais fácil para o Presidente do que a actual, porque até aliados de Iuschenko, como o Partido Socialista, se manifestam contra a revisão da "reforma política".
O actual Presidente já permitiu a organização de um referendo sobre esta questão fulcral, o que certamente não irá acrescentar estabilidade política no país.
Iuschenko encontra-se numa situação semelhante à de Boris Ieltsin, Presidente da Rússia, em 1993, nas suas relações com os deputados russos: Ieltsin recorreu aos tanques para fuzilar o Parlamento do país, acção com consequências muito nefastas para a actual democracia russa. Iuschenko não pode fazer o mesmo e tem de encontrar outras vias de solução dos problemas com as forças políticas ucranianas.