Milosevic morre na prisão de Haia antes do fim do julgamento
O antigo Presidente da Jugoslávia, Slobodan Milosevic, 64 anos, indiciado por genocídio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade pelo Tribunal Internacional para a ex-Jugoslávia (TPIJ) e em julgamento desde Fevereiro de 2002, foi ontem encontrado morto na sua cela na prisão da Scheveningen, nos arredores de Haia. "Hoje, Milosevic foi encontrado sem vida no seu leito na sua cela do centro de detenção das Nações Unidas em Scheveningen", anunciou em comunicado a instância judicial ad hoc da ONU, e que esperara concluir ainda este ano o julgamento de uma personagem central das guerras jugoslavas da década de 1990. Foi o primeiro ex-chefe de Estado a comparecer no banco dos réus para responder às graves acusações.
O tribunal ordenou de imediato a realização "de uma autópsia e de um exame toxicológico" e a abertura de um inquérito. Esta decisão originou os primeiros protestos e manifestações de desconfiança, emitidos pelo seu advogado, pelo seu irmão, que vive em Moscovo, pelo seu partido (Partido Socialista da Sérvia, SPS), por simples cidadãos da Sérvia.
A morte de Milosevic coloca a instituição de Haia numa situação delicada. Esta foi a quarta morte de detidos, após o suicídio, na passada segunda-feira, do ex-líder dos sérvios da Croácia, Milan Babic, de Slavko Dokmanovic, um outro sérvio da Croácia, em Junho de 1998, e da morte natural em Agosto do mesmo ano de um sérvio bósnio, Milan Kovacevic. Um porta-voz da instância, Christian Chartier, assegurou ontem que eram concedidos "importantes cuidados médicos aos detidos, e a este em particular".
O antigo homem forte de Belgrado sofria de problemas cardio-vasculares, e por diversas vezes o seu julgamento - Milosevic nunca reconheceu credibilidade à instância judicial e optou por se defender a si próprio - teve de ser adiado devido aos problemas de saúde do suspeito.
Advogado garante que Slobodan não tencionava suicidar-seSteven Kaye, um dos seus advogados designados pelo tribunal, e que Milosevic nunca aceitou, disse ontem à BBC que o detido lhe garantiu há apenas algumas semanas que "não tinha qualquer intenção de pôr termo aos seus dias". Mas em finais do mês passado, os juízes do TPIJ recusaram um pedido de libertação provisória deposto pelos seus advogados, para permitir que Milosevic recebesse durante alguns dias tratamentos médicos na Rússia, onde vivem hoje o seu irmão e a sua mulher, Mirjana Markovic. Ontem, Moscovo voltou a lamentar a decisão do tribunal, após ter fornecido todas as garantias sobre o regresso do suspeito a Haia.
Belgrado exigiu de imediato um relatório "detalhado" sobre as causas da morte, enquanto um conselheiro jurídico do antigo Presidente, Zdenko Tomanovic, afirmou que o seu cliente lhe afirmou recentemente que o tentaram envenenar, e pediu que a autopsia fosse efectuada em Moscovo.
Pelo contrário, e de acordo com a agência holandesa ANP, o corpo foi transferido no final do dia para o Instituto médico-legal holandês (NFI) em Haia, e foi informado que um médico patologista sérvio poderá assistir à autopsia, que deverá ser realizada esta manhã.
Milosevic respondia a mais de 60 actas de acusação devido ao protagonismo desempenhado no decurso da violenta desintegração da Jugoslávia e as guerras que assolaram a Croácia (1991-1995), Bósnia-Herzegovina (1992-1995) e Kosovo (1998-1999).