"Herança de Salazar" reduzida a metade em 30 anos
Apesar de ter hoje menos de metade do que as reservas existentes no final de 1974, Portugal continua a ser dos países que mais ouro tem: com mais de 400 toneladas, está no 15º lugar do ranking das maiores reservas do metal amarelo. No entanto, as vendas têm sido regulares e a política de gestão das reservas deverá seguir, de acordo com a revisão de Setembro de 2004 do "Acordo dos Bancos Centrais sobre o Ouro", a mesma trajectória.A propósito da transferência do Fundo de Pensões da Caixa Geral de Depósitos para a Caixa Geral de Aposentações pelo anterior Governo, lançou-se a polémica sobre o destino a dar às reservas de ouro. Miguel Cadilhe, ex-ministro das Finanças do governo de Cavaco Silva, sugeriu então a constituição de um fundo extraordinário de investimento, para usar no sentido de reduzir o peso da Administração Pública na economia.
Agora que o ouro está em alta, Luís Guimarães, economista, referiu ao PÚBLICO que a sua convicção acerca das reservas de ouro é de que se devem "vender". Para o economista, "não faz sentido ter o ouro", uma vez que é "uma mercadoria e não representa mais do que isso". Vítor Bento, também economista e presidente da SIBS, gestora da rede Multibanco, considera que este "é um activo como outro qualquer" e que "não há nada contra a [sua] venda", pois "não há hoje qualquer sacralização do ouro". Para Luís Guimarães, o Banco de Portugal devia já ter procedido a vendas "com mais acutilância", embora se deva ter o cuidado de "não inundar o mercado". O economista acrescentou ainda que a venda do metal precioso poderia ajudar a "compor a balança portuguesa de pagamentos, através do aumento das exportações".
A respeito da opção da Rússia de dobrar as suas reservas em ouro, Vítor Bento sublinhou que "há preferências diversificadas" e que "o mercado só existe por não estarmos todos do mesmo lado".
Vendas concertadas com o Banco Central Europeu
Segundo o Banco de Portugal, em 1974 o país tinha 865,94 toneladas de ouro, mais do dobro da quantidade actual. Ter os cofres cheios foi considerado, por muitos portugueses, a "grande herança de Salazar". Ao longo do tempo, a República foi-se desfazendo do ouro, principalmente devido à perda do seu papel monetário: se até 1971 o ouro detido por cada país era a referência para a emissão de moeda, a partir desta data o metal precioso deixou de ter essa função. A emissão de moeda passou a estar dependente de outros factores, como o Produto Interno Bruto do país.
Em 1999, o Banco de Portugal, o Banco Central Europeu e os bancos centrais de mais treze países da Europa comunicaram em conjunto que apesar de o ouro continuar "a ser um elemento importante das reservas monetárias globais", tinham decidido a venda concertada de reservas até 2004, momento em que se faria uma revisão do acordo. Nesse período, as vendas não poderiam exceder as 2000 toneladas e, anualmente, deveriam ser colocadas no mercado um máximo de 400 toneladas.
Assim. Portugal vendeu, em 2002, 15 toneladas e no ano passado mais 55 toneladas. As 462,28 toneladas de ouro que existiam no final de 2004 foram então avaliadas em 4 779,22 milhões de euros, mas entretanto venderam-se mais 35 toneladas, já este ano. Objectivo: "Continuar a diversificação das reservas externas", explicou o Banco de Portugal em comunicado. M.P.