Presa do narval é um órgão nervoso que funciona com um sensor de sentido apurado
Dez milhões de sensores conduzem informação até ao cérebro desta baleia
Muitas teorias já foram avançadas sobre o que era e para que servia a enorme presa do narval macho. Mas nenhuma tinha descrito esta presa como um órgão sensorial, enervado ao mais alto nível, capaz de detectar variações de temperatura, pressão e até salinidade nas geladas águas do Árctico. É isto que um dentista, especialista em mamíferos marinhos, defendeu agora pela primeira vez na Conferência de Biologia de Mamíferos Marinhos, que termina hoje em San Diego, nos Estados Unidos.O enorme dente do narval inspirou uma série de mitos e lendas. Pensa-se que a sua imponência pode ter inspirado, na Idade Média, a lenda do unicórnio. Mas cientificamente pouco se sabe sobre para que serve e o que representa esta presa que, nos machos, pode chegar a três metros, metade do tamanho do animal.
O narval tem apenas dois dentes. Nos machos, um deles cresce desmesuradamente e irrompe através do lábio superior, crescendo numa forma espiralada. Pensou-se, com base nas raras observações feitas destas baleias, que este enorme dente poderia servir para defesa em relação a investidas de outros machos, ou para quebrar placas de gelo, por exemplo.
Agora Martin Nweeia, da Universidade de Harvard e investigador de mamíferos marinhos dos museus Smithsonian, descobriu, observando presas com um microscópio electrónico, que estas são formadas por cerca de dez milhões de microtubos que se estendem desde a polpa, a parte enervada no centro do dente - tal como se passa num dente humano - e que fazem a ligação deste sensor gigante com o mundo exterior.
"Único na natureza""Não há comparação na natureza com esta forma única de constituição dentária e de adaptação", frisou o cientista, um comunicado emitido pela Universidade de Harvard.
"Esta baleia tem a capacidade de mergulhar a mais de 400 metros e mesmo assim conseguir discriminar alterações na concentração de partículas na água, de salinidade e de presença de presas", disse Nweeia à revista New Scientist.
Para além disso, consegue detectar variações na pressão e na temperatura. "Por que é que uma presa rompe com as regras do desenvolvimento normal e acolhe milhões de vias sensoriais ligando o sistema nervoso do narval ao gelado ambiente do Árctico? Estes factos surpreenderam-nos de uma forma inesperada", confessou Nweeia.
Ao contrário do que defendem alguns povos de caçadores do Árctico canadiano, que perseguiram esta espécie de baleia durante milhares de anos, a presa não serve para a luta com outros machos, nem como arma contra investidas humanas. A presa do narval é a única no reino animal que cresce em espiral e não em curva, e que consegue vergar cerca de um metro para cada lado sem partir.
Mas o facto de este unicórnio do Árctico ser difícil de observar, preferindo circular por baixo das placas de gelo, fez com que pouco se saiba sobre a espécie.