O massacre que iniciou uma ambiciosa caça ao homem
Depois do massacre dos seus atletas em Munique, Israel planeou uma caça metódica aos responsáveis. Foi uma das mais ambiciosas operações secretas de contraterrorismo
Em 1972, a Alemanha recebia pela primeira vez os Jogos Olímpicos desde que, em 1936, Hitler fizera deles uma plataforma para mostrar ao mundo a superioridade da raça ariana. O massacre de 5 de Setembro de 1972, a seis dias do início dos jogos, ganhou, assim, uma dimensão duplamente traumática, por ter sido cometido na Alemanha, e pelo peso do fantasma nazi na memória judaica. Nessa madrugada, 11 atletas israelitas foram sequestrados na aldeia olímpica de Munique por oito activistas de um grupo designado Setembro Negro, vinculado a uma facção da Fatah, o partido de Yasser Arafat, líder da OLP. Dois atletas foram imediatamente mortos, e depois de quase um dia de negociações frustradas - a então primeira-ministra de Israel, Golda Meir, recusou a libertação de 234 prisioneiros palestinianos reivindicada pelos sequestradores -, os acontecimentos saldaram-se numa falhada tentativa de resgate por parte de forças especiais alemãs: os nove reféns israelitas foram mortos durante os confrontos.Foi o prólogo de uma das mais ambiciosas campanhas secretas de contraterrorismo de que há memória: dez dias depois, os israelitas planeavam uma retaliação estratégica e metódica ao mais alto nível, com Golda Meir a autorizar a formação de equipas especiais de agentes secretos para localizar e assassinar os responsáveis pelo ataque de Munique. Um jovem comando de 25 anos, herói da Guerra dos Seis Dias, que ficará conhecido sob o pseudónimo de Avner, é eleito para liderar uma das equipas. A missão de Avner, e dos outros quatro homens do seu grupo, será eliminar onze homens identificados como tendo uma ligação directa ou indirecta à planificação e execução do sequestro dos atletas israelitas. A agência de espionagem israelita Mossad, que coordenava a operação, comprometia-se a depositar um "salário" generoso todos os meses numa conta de um banco suíço.
A caça aos alvosSem bases sólidas para começar a operação, Avner decidiu dispersar a sua equipa por diferentes pontos da Europa para desenvolver contactos que pudessem contribuir para a missão. O próprio Avner contou com a cumplicidade do grupo terrorista alemão Baader-Meinhof para apoio logístico na execução da primeira "presa": Wael Zwaiter, primo em segundo grau de Arafat e responsável por actividades terroristas na Europa, que vivia e operava em Roma. A 16 de Outubro de 1972, Zwaiter foi morto à queima-roupa no complexo de apartamentos onde residia. A primeira missão foi cumprida com êxito. A 8 de Dezembro, novo sucesso: um dos elementos da equipa fizera-se passar por jornalista, combinando uma entrevista por telefone com o alvo, Mohmoud Hamshari, membro da OLP e coordenador do ataque do Munique. À hora marcada, Hamshari atendeu o telefone e a equipa fez detonar os explosivos através de um sistema de controlo remoto.
A missão seguinte foi mais aparatosa, porque envolvia alvos múltiplos: em Abril de 1973, a equipa desembarcou numa praia de Beirute, matando três altos responsáveis da OLP e da Fatah, Kamal Nasser, Abu Yussuf e Kemal Adwan, além de cerca de uma centena de guerrilheiros da OLP.
O mais ambicioso alvo da lista era Ali Hassan Salameh, tido como arquitecto do ataque de Munique. Em Julho de 73, houvera uma primeira tentativa de assassínio em Lillehammer, na Noruega, que, devido a pistas falsas, culminou na morte de um inocente empregado de mesa marroquino. Os agentes envolvidos foram detidos e o episódio expôs a Mossad e o envolvimento do governo israelita. Esse não era o grupo de Avner, mas uma segunda equipa que a Mossad tinha enviado para o terreno - sem Avner ter conhecimento. As relações entre Avner e a Mossad começaram a azedar e, em 1974, Avner desliga-se oficialmente da agência secreta. Oito dos 11 nomes a abater tinham sido eliminados, mais um líder da OLP que não constava da lista. Anos mais tarde, Avner viria a relatar as operações da sua equipa a um jornalista, George Jonas. O livro que resultou daí, Vengeance (1984), serviu de base ao argumento do novo filme de Steven Spielberg. Só em 2002, Israel reconheceu oficialmente ter levado a cabo a operação.
A noção que persiste até hoje é que os israelitas eliminaram todos os implicados no atentado de Munique. Mas o livro de um jornalista da Time, Aaron J. Klein, que será publicado em breve, Striking Back, vem agora defender que, em grande parte, as vítimas não tiveram nada a ver com Munique, e que os israelitas deixaram vivos alguns do que estavam envolvidos. Klein crê mesmo que a Mossad só eliminou um elemento directamente ligado ao massacre, Atel Bseiso, assassinado em... 1992.