O problema da informação na radiação de Buracos Negros
Uma das consequências mais surpreeendentes da teoria da Relatividade Geral de Einstein é a previsão da existência de objectos astrofísicos ultracompactos, de cuja atracção gravitacional nem sequer a luz pode escapar. Estes objectos foram previstos no contexto da teoria Newtoniana da gravitação, pelo reverendo inglês John Mitchell e pelo astrónomo francês Pierre Laplace, no final do século XVII e no início do século XIX, respectivamente. Porém, depois de uma palestra lendária do físico norte-americano John Wheeler, no Outono de 1967, estes objectos passaram a ser designados por buracos negros. Um grande número de observações astronómicas sugerem que estes objectos tenham massas da ordem de algumas massas solares ou muitos milhões de massas solares, que estão na região central das galáxias. Do ponto de vista da teoria de Einstein, os buracos negros são completamente escuros, pois não emitem qualquer tipo de radiação. No entanto, em 1974, Stephen Hawking demonstrou que, devido a efeitos de natureza quântica, os buracos negros emitem radiação muito semelhante à radiação térmica radiada por qualquer corpo aquecido.
Apesar desta semelhança, existe, contudo, uma diferença fundamental. Os buracos negros estão separados do exterior por uma "membrana" unidirecional, denominada horizonte dos acontecimentos, do interior da qual nenhum corpo pode escapar, pois tal exigiria velocidades superiores às da luz, o que é impossível.
Para além disto, demonstra-se que apenas a massa, a carga eléctrica e o momento angular de um corpo que caia no buraco, entre todas as suas propriedades físicas, podem ser inferidos do exterior. Assim, caso não existisse a radiação de Hawking, haveria uma inevitável perda de informação.
De facto se, por exemplo, uma enciclopédia caísse num buraco negro, do exterior somente a informação relativa à sua massa, carga eléctrica e momento angular poderiam ser deduzidas por meio do estudo da dinâmica do buraco negro. A existência da radiação de Hawking levanta a hipótese de que a informação contida na enciclopédia possa estar contida na radiação de forma codificada. A situação é análoga à queima da enciclopédia: a informação que nela está contida pode ser, pelo menos em princípio, recuperada das cinzas e do fumo que resultam da queima.
Durante quase três décadas, Hawking argumentou solitariamente contra esta possibilidade; porém, no Verão de 2004, acabou por admitir que as suas conclusões eram baseadas em aproximações que, à luz de desenvolvimentos recentes no contexto das teorias modernas de unificação das cordas quânticas, não são justificadas. Afinal, reconheceu o célebre físico, a informação pode estar contida na radiação emitida pelo buraco negro. Mas está ainda por descobrir a forma como a informação que cair no buraco negro pode ser recuperada através do estudo da radiação que emite.
Este é o nono de uma série de artigos de professores e investigadores do Instituto Superior Técnico, que serão publicados aos domingos, para comemorar o Ano Internacional da Física