Mais de 30 por cento dos magistrados não comunicaram adesão à greve
Os números oficiais, a que o PÚBLICO teve acesso (ainda que provisórios por o desconto nos vencimentos só ser processado em Dezembro), mostram também uma grande discrepância entre os níveis de adesão avançados pelas associações sindicais dos magistrados e o número de magistrados que comunicou a adesão à greve aos respectivos tribunais superiores.
Os dados, que ainda poderão ser actualizados ou por erros de envio da comunicação para a entidade competente ou por ter havido magistrados que por lapso ainda não tenham comunicado, não deverão, no entanto, ser substancialmente diferentes dos já compilados. Até porque, segundo as próprias organizações sindicais e o Conselho Superior da Magistratura, a comunicação da adesão à greve não é obrigatória.
Disparidade nos númerosQuanto aos elementos para já disponíveis mostram que pode haver grandes disparidades entre o número de magistrados que aderiu à greve (segundo ambos os sindicatos, rondou os 95 por cento e foi idêntica nos dois dias) e os que comunicaram essa mesma adesão (perdendo o salário respectivo).
Assim, na magistratura judicial, o maior número de juízes que comunicaram a adesão à greve estava colocado na comarca de Évora. Num total de 170 juízes, 148 (87 por cento) fizeram greve. Mas não nos dois dias, porque, nesse caso, os números descem para 77 por cento. Por sua vez, no distrito judicial de Coimbra e Porto os números são semelhantes. Setenta e 75 por cento, respectivamente, aderiram à greve, com a diferença de que no Porto os que o fizeram (a comunicação) deram conta de que paralisaram durante os dois dias. Nove por cento dos juízes que fizeram greve em Coimbra disseram que pararam só um dia.
Por último, no caso dos juízes, o número desce substancialmente em Lisboa. Dos 495 magistrados, 273 (55 por cento) disseram ter aderido aos dois dias de greve. Por sua vez, 18 (3,64 por cento) disseram só ter feito um dia de greve.
No que se refere aos magistrados do Ministério Público, os fenómenos são relativamente idênticos, com excepção de Lisboa. Nesse caso, os dados a que o PÚBLICO teve acesso davam conta de que nenhum magistrado havia comunicado a adesão à greve ao Tribunal da Relação respectivo.
Por sua vez, no distrito judicial do Porto, de um total de 364 magistrados, 269 (73 por cento) comunicaram a adesão a dois dias de greve, enquanto 46 (12 por cento) apenas terão feito um dia de greve.
Em Coimbra e Évora, os números da comunicação também descem. No primeiro distrito judicial, só 95 de 186 procuradores (51 por cento) comunicaram a adesão à greve de dois dias. Trinta e cinco viram só um dia de greve ser descontado no vencimento, o que representa 18 por cento do universo de procuradores da 1ª instância de Coimbra. Em Évora, só 35,44 por cento disseram ter feito os dois dias de greve (65 num universo de 158), enquanto 9 (5 por cento) disseram ter aderido à greve só num dos dias.
Os números totais dão então conta de que, para já, apenas 59 por cento dos magistrados da primeira instância comunicou a adesão à greve, sendo que 70 por cento foram juízes e 45 por cento procuradores do Ministério Público. E, desse universo, cerca de 10 por cento disseram só ter feito um dia de greve.
Quanto aos descontos já processados, pela perda dos dias de vencimento, foram de 391 mil euros.
Dever de assiduidade não abrange magistradosOs magistrados não têm de comunicar a adesão à greve. Quem o disse foi a Direcção Nacional da Associação de Juízes que considerou que isso só se verificaria se estivessem vinculados ao dever de assiduidade. "Quando alguém adere à greve está a abster-se de prestar a sua actividade a coberto da suspensão do dever de assiduidade, do qual está desvinculado, situação juridicamente diversa da falta ao serviço, que só se verifica enquanto exista o referido dever de assiduidade", escreveu então o vice-presidente da associação, num parecer onde concluía: "Não há o dever jurídico de realizar tal comunicação, prévia ou mesmo posterior. (...) Comunicar seria até contrariar a essência da greve e o princípio de livre adesão."
Mesmo assim, para evitar "equívocos", a associação deixava no ar a hipótese de os juízes comunicarem. "Poderá apenas ter utilidade, mas enquanto acto voluntário e não dever, no caso em que seja a única forma de demonstrar a adesão à greve, por exemplo para quem esteja colocado em tribunais superiores."