Espanha ensaia vacina transgénica para recuperar coelho bravo
Experiência em Valladolid pode beneficiar também os predadores destes animais, entre
eles a águia-real
e o lince ibérico
A população de coelhos bravos em dois locais da região de Valladolid, em Espanha, vai receber uma vacina geneticamente modificada para tentar fazer frente à doença que mais os afecta: a mixomatose. Espera-se que este ensaio, que decorre até ao fim de Outubro, ajude à recuperação não só dos coelhos bravos, mas também dos seus predadores, como a águia-real e o lince ibérico, ameaçados pela falta de coelhos, que são a base da sua alimentação.Na Península Ibérica, estes pequenos mamíferos têm sido muito afectados pela mixomatose e pela doença hemorrágica do coelho, que tem dizimado as populações em tempos abundantes, quer em Portugal, quer em Espanha. Ambas são doenças virais. A mixomatose é uma doença infecto-contagiosa, causada por um poxvírus denominado fibroma de Shope. Quanto à doença hemorrágica, é causada por um calicivírus. Têm ambas um alto nível de mortalidade, e podem transmitir-se por contacto directo ou através de insectos.
Por outro lado, colmatar a falta de coelho bravo é um eixo central na política de recuperação da águia-real e do lince ibérico, espécies muito ameaçadas e conhecidos predadores de coelho, em prol das quais muitas equipas têm desenvolvido programas de recuperação e muito dinheiro tem sido investido.
Juntando estes dois factores, Rodrigo Serra, veterinário especialista em felinos e técnico do Instituto de Conservação da Natureza, diz que estas vacinas, em que foi usada a engenharia genética para produzir uma reacção imunitária, podem bem ser o golpe de asa para ajudar estas espécies a vencer a extinção.
Desta vez, trata-se de um ensaio controlado, conduzido em dois locais a norte de Madrid - no centro de conservação de aves em Valladolid e no Parque Natural de Valwo, em Matozuelos.
Segundo Rodrigo Serra, a vacina não prejudicará nem o coelho, nem os seus predadores, pelo facto de ser transgénica. Muito pelo contrário: "Se forem bem pensadas e trabalhadas, estas vacinas retiram ao vírus a capacidade de causar danos. Simplesmente apresentam ao sistema imunitário do coelho proteínas características do vírus, para que sejam reconhecidas e combatidas quando o coelho for exposto à doença."
Predadores a salvoSobre o efeito nos predadores, Rodrigo Serra acrescenta: "Nenhum dos predadores usado no teste é susceptível ao vírus original, como tal é difícil que o sejam ao vírus geneticamente modificado. O vírus já existe na Península Ibérica, sem efeitos visíveis nos predadores." Como é explicado na ficha do ensaio, os animais testados estarão confinados à área de teste e não livres na natureza.
Contactada pelo PÚBLICO, Astrid Vargas, coordenadora do centro de criação em cativeiro do lince ibérico, em Doñana, na Andaluzia, diz que apesar das vacinas com vírus modificados terem levantado já muita polémica na União Europeia, o que é importante é que estes procedimentos sejam levados a cabo nas máximas condições de segurança. "No que toca ao lince ibérico, é de uma importância crucial conseguir uma vacina eficaz para coelhos."