Experiência com ratinhos mostra que fármaco contra o cancro pode regenerar lesões na espinal medula
Testadas 400 substâncias em busca de moléculas que promovam o crescimento de axónios das células nervosas
Um medicamento destinado a combater o cancro do pulmão poderá ajudar a regenerar a espinal medula danificada. Esta nova direcção no tratamento das lesões da espinal medula foi sugerida pelas experiências feitas em ratinhos por investigadores de Boston, liderados por Zhigang He, recentemente publicadas na revista Science.O medicamento erlotinibe (Tarceva) tem a aprovação da Food and Drug Administration, a entidade controladora dos fármacos dos EUA, para o tratamento de certos tipos de cancro do pulmão. Este medicamento está agora a ser testado em ratinhos com a espinal medula lesionada pela empresa Genentech, que fabrica o Tarceva.
O trabalho identificou a proteína de membrana EGFR como um novo alvo terapêutico. Este estudo testou 400 substâncias, em busca das que promovessem o crescimento de novos axónios de neurónios do sistema nervoso central, que é constituído pelo cérebro e espinal medula. O axónio é a fibra condutora do neurónio, que estabelece contacto com outros neurónios, passando-lhes informação através de impulsos nervosos.
A maioria das substâncias, quando testadas em neurónios de ratinhos em cultura, não fez crescer novos axónios. No entanto, várias substâncias bloqueadoras de EGFR tiveram efeitos significativos. Estas foram depois testadas em animais vivos com lesões do nervo óptico, apresentando uma regeneração axonal nove vezes superior à de animais não tratados.
Desde há 15 anos que se conhecem os factores que impossibilitam a regeneração dos axónios: células adjacentes de tipo não neuronal segregam proteínas que inibem o seu crescimento. Nos últimos dois anos, foram desenvolvidas técnicas que bloqueiam a acção inibidora destas proteínas. No entanto, estas técnicas resultavam sempre em baixos índices de crescimento axonal.
Este estudo representa um recorde nos índices de crescimento axonal. Entre as substâncias bloqueadoras de EGFR testadas encontrava-se o Tarceva. "Mesmo que os testes revelem bons resultados, os bloqueadores de EGFR, por si só, poderão não ser suficientes para curar totalmente as lesões. Há estudos que sugerem que podem ser necessárias outras substâncias que promovam a regeneração axonal", acautela o neurobiólogo da Genentech Marc Tessier-Lavigne, um dos colaboradores deste estudo. "É como conduzir um carro - tirando o pé do travão ainda se avança, mas a partir de certo ponto há que dar-lhe gás para se avançar mais."