"Há alturas na vida em que nos temos que juntar à família"
Todo o soarismo, muita esquerda não-alinhada. Carvalho da Silva mandou carta de apoio. O PS compareceu em peso, à excepção do líder parlamentar, que defendia a candidatura de Manuel Alegre. Uma plateia de maiores de 40 anos veio apoiar Soares com intrépido entusiasmo juvenil
Carlos Vargas, subdirector da RTP-2, foi conselheiro de Ramalho Eanes e membro da Comissão Política de Maria de Lourdes Pintasilgo. Ontem, foi ao Altis, dar o seu apoio a Mário Soares, porque "há alturas na vida em que nos temos que juntar à família". O velho "povo de esquerda" acorreu em massa e até um alto dirigente do Bloco de Esquerda marcou presença. Fernando Rosas estava sentado na primeira fila dos apoiantes, "num acto que se deve ler à luz de uma amizade e colaboração antigas". Votará no candidato do Bloco que, insistiu Rosas, é para chegar às urnas.
Foi, efectivamente, a reunião da "família": apareceram quase todos os velhos soaristas da primeira hora (faltaram Alegre e Guterres). À esquerda, Carlos Antunes, o antigo dirigente das Brigadas Revolucionárias (PRP-BR), Helder Costa, Maria do Céu Guerra, Vitorino, eram alguns nomes entre a multidão que não coube na sala reservada. Vítor Ramalho teve que pedir desculpa e encaminhar o resto da mole humana que acorreu ao Altis para uma segunda sala, onde foi instalado um ecrã. A sala reservada era a mesma de 1991, mas apareceu muito mais gente. Carvalho da Silva, líder da CGTP, mandou uma carta considerando a candidatura de Soares "um acto muito positivo", fazendo votos, a título pessoal, "para que os propósitos que animam a candidatura de V. Excelência sejam plenamente alcançados".
Na primeira fila, o apoio institucional do PS (José Sócrates, António Costa, Almeida Santos, Carlos César, António Vitorino) e da família: Maria Barroso e a filha Isabel Soares. João atrasou-se e ficou na outra sala. Olímpia Soares, mãe de três netos de Mário Soares, também presentes, ocupou lugar na primeira fila.
A "cultura" estava representada por Paula Rego, Júlio Pomar, José Cutileiro, António Mega Ferreira, António Pedro de Vasconcelos, Henrique Cayatte, Joaquim de Almeida, Luís Represas. O "desporto" por Rosa Mota, Aurora Cunha e Fernanda Machado. O "jornalismo" por Mário Mesquita, José Carlos de Vasconcelos, Rogério Rodrigues, Viriato Teles, Carlos Vargas. Ana Sousa Dias apareceu, mas só como observadora. Os "empresários" por Ilídio Pinho, Rui Moreira, André Jordan, Fernanda Pires da Silva, Jorge Armindo. A "Igreja", pelo padre Vítor Melícias. A "maçonaria" por António Arnaut, ex-grão-mestre do Oriente Lusitano (entre muitos outros, naturalmente).
José Medeiros Ferreira, um dos principais impulsionadores do regresso de Mário Soares (já o tinha defendido publicamente há dois anos) rejubilava. Da ala esquerda do PS, a figura mais relevante era Augusto Santos Silva, ministro dos Assuntos Parlamentares. Mas o Governo estava em peso. Faltava o líder do grupo parlamentar do PS, Alberto Martins, e também José Vera Jardim e Maria de Belém Roseira, que defenderam a candidatura de Manuel Alegre. Manuel Maria Carrilho, candidato à Câmara de Lisboa, lá apareceu.
A idade não afrouxou o entusiasmo. A plateia não tinha jovens (o mais novo dos presentes era, provavelmente, Sérgio Sousa Pinto, ex-líder da JS e actual deputado ao Parlamento Europeu), mas empenhou-se ruidosamente no apoio ao seu candidato. Os aplausos interrompiam continuamente o discurso. Vinte anos depois, voltava-se a ouvir, rejubilante, o grito "Soares é fixe", o velho grito dos jovens do velho MASP, Movimento de Apoio Soares à Presidência, agora entoado por uma assistência na meia-idade.
A dada altura, o som avariou. Foi com a mesma bonomia com que já estava a aguentar o calor insuportável da sala que Mário Soares ultrapassou a falha técnica. Pediu um microfone móvel. "Então, já está?" O som ainda foi abaixo mais uma vez. O histórico bom-humor de Mário Soares manteve-se inalterado do princípio ao fim, quando recordou a polémica à volta da sua idade. Terá 81 anos no momento da eleição "como alguns têm tido a simpatia de sublinhar" - "Mas em bom estado físico e mental, como a própria campanha vai confirmar."
E a espantosa bonomia de Mário Soares prosseguiu após o discurso, quando atravessou a sala, ao lado de Maria Barroso, sob o insuportável peso da multidão, dos fotógrafos e dos operadores de câmara. Cumpriu-se, assim, o primeiro acto da campanha eleitoral.