"Rei George" troca futebol pela política na Libéria
Com promessas de água e luz, o antigo jogador do Chelsea é a estrela da campanha eleitoral que começou esta semana no país africano devastado pela guerra
Os adversários acusam-no de não ter estudos superiores nem experiência política, mas para os apoiantes de George Weah, estrela do futebol internacional, ex-jogador do Chelsea e do AC Milan, e actual candidato à Presidência da Libéria, basta ouvi-lo dizer: "Eu não preciso de experiência política para vos dar escolas. Nem para vos dar luz e água, ou para ver como as estradas estão más. Eu sei de onde vocês vêm". Rodeado por milhares de jovens em êxtase, protegido por guarda-costas com t-shirts negras onde se lê "Segurança" e "Battle Cry", George Weah lançou esta semana a sua campanha eleitoral em Monróvia, a capital da Libéria, um país devastado por uma terrível guerra civil que só terminou há dois anos.
Weah, com 38 anos, sabe de onde vêm todos aqueles jovens. Vêm exactamente de onde ele veio. Nascido num bairro de lata nos subúrbios de Monróvia, um entre 13 irmãos, o futuro futebolista foi criado por uma avó. Nunca estudou na universidade, mas é hoje um milionário, que tem investido muito do seu dinheiro em projectos de ajuda na Libéria (como embaixador para a UNICEF, fez campanha pela desmobilização das crianças-soldado e pela prevenção da sida) e na equipa nacional de futebol. Os que se preparam para votar nele nas eleições de 11 de Outubro acreditam que, pelo menos, Weah não irá roubar os cofres do Estado como era prática corrente dos seus antecessores.
O antigo Jogador do Ano da FIFA em 1995 enfrenta, no entanto, entre outros 21 candidatos alguns adversários de peso, nomeadamente uma antiga vice-presidente do Citibank e ex-funcionária do Banco Mundial, Ellen Johnson-Sirleaf, veterana da política liberiana e apoiada pela classe média. Mas também o antigo líder rebelde Sekou Conneh, que ajudou a expulsar o anterior Presidente, Charles Taylor, para o exílio. Ou ainda Roland Massaquoi, considerado um protegido do mesmo Charles Taylor.
Os estudos superiores dos seus adversários não intimidam Weah. "Os políticos têm estado por cima, e as massas por baixo durante muitos anos. É altura das massas passarem para cima", disse, numa entrevista à Associated Press. "Com toda a educação e experiência que têm, governaram esta nação durante 100 anos, e não fizeram nada por ela".
O cenário à sua volta, em Monróvia, confirma as suas palavras. Há mais de uma década que a capital - que antes de 2003 foi alvo de um brutal cerco por grupos rebeldes, que a fustigavam permanentemente com tiros de morteiros - está sem água corrente ou electricidade. Acabar com isso é a primeira promessa de Weah. "Temos que reconstruir a nossa infraestrutura", disse no seu primeiro comício. "Temos que pôr as nossas crianças na escola. Os nossos camponeses precisam de ter forma de transportar os alimentos e as pessoas precisam de ser libertadas desta escuridão perpétua".
Os jovens são grande parte da população, e durante quase toda a sua vida não conheceram mais nada senão a guerra - correram mundo as imagens de crianças soldado na Libéria, empunhando armas pelas ruas de Monróvia, muitas vezes sob o efeito de marijuana ou anfetaminas e usando grandes óculos escuros e até extraordinárias cabeleiras postiças.
Agora, desde que foram assinados os acordos de paz, em 2003, e o país iniciou uma transição para a democracia apoiada pela presença de 15 mil soldados da ONU, muitos destes jovens estão finalmente a regressar às escolas. E são eles, em grande parte, os entusiásticos apoiantes de Weah (que inclui, entre as suas promessas, a de dar trabalho a 70 mil antigos combatentes). Isto significa que o jogador tem que conter ímpetos mais violentos que por vezes surgem entre apoiantes de candidaturas rivais.
"Muitos dos seus apoiantes são os mesmos jovens que pegaram em armas contra homens, mulheres e crianças inocentes e devastaram este país", disse à Reuters Henry Rene Flomo, um estudante universitário de 27 anos. "[Weah] tem que ter muito cuidado com estas pessoas. Ele devia estar a usar a sua fama e dinheiro para abrir programas de treino para os jovens em vez de lhes pedir apoio para as suas ambições políticas".
Mike McGovern, do International Crisis Group, concorda: "Todos os candidatos nestas eleições estão rodeados por pessoas que querem enriquecer. É preciso ter cuidado".
Para já, a campanha acaba de começar, e tudo parece correr bem para o homem a quem muitos liberianos chamam "Rei George". Os seus apoiantes acham mesmo que ele é tão popular que as eleições são desnecessárias. Um dos slogans que gritam é: "Eleições não; Weah já está na mansão [o palácio presidencial]". O "rei" diz-lhes apenas: "Quando olhos para os vossos rostos, vejo que sou o vosso futuro".