Afinal, a Via Láctea não é uma galáxia em espiral perfeita
A observação de uma barra de estrelas no centro da nossa galáxia foi agora confirmada
A Via Láctea, a galáxia que alberga o nosso sistema solar, não é afinal uma galáxia em espiral normal, pois esconde no centro uma barra formada por estrelas. Esta observação, feita pelo telescópio Spitzer, da agência espacial norte-americana NASA, confirma uma suspeita com algumas décadas e será publicada num dos próximos números da revista científica Astrophysical Journal Letters. As galáxias classificam-se em vários tipos, conforme a sua forma. Há várias classificações, mas a proposta pelo astrónomo norte-americano Edwin Hubble, em 1926, é a mais simples, explicam os astrónomos amadores Guilherme de Almeida e Pedro Ré, no livro Observar o Céu Profundo (Plátano).
Segundo essa classificação, as galáxias podem ser de quatro tipos principais: espirais, espirais com barra (ou barradas), elípticas e irregulares. Nas galáxias espirais, os seus braços arqueados emergem directamente do núcleo, ao contrário das galáxias espirais com barra. Aí, os braços têm origem nas extremidades de uma barra no núcleo da galáxia - explicam ainda Guilherme de Almeida e Pedro Ré.
Desde a década de 80 que os cientistas suspeitam da presença de uma barra no coração da Via Láctea, uma hipótese apoiada por observações com radiotelescópios. Detectou-se gás que sugeria a existência dessa barra. Nos anos 90, novas observações do centro da Via Láctea, vendo a sua radiação infravermelha, voltavam a apoiar a hipótese da barra central. Porém, as poeiras no centro da galáxia dificultavam as observações, lembra a revista de divulgação científica New Scientist.
Por isso, os cientistas debatiam se a estrutura central da Via Láctea seria a de uma barra, a de uma elipse ou até de ambas.
Agora, a equipa de Robert Benjamin, da Universidade de Wisconsin, em Madison, nos EUA, viu um pouco mais através das poeiras, utilizando o Spitzer (este telescópio, lançado no espaço em Agosto de 2003, também vê a radiação infravermelha, mas em comprimentos de onda ligeiramente diferentes das observações anteriores).
Observaram-se mais de 30 milhões de estrelas situadas no plano galáctico, na região à volta do centro da Via Láctea, e viu-se que a barra central existe e até é maior do que se pensava.
Composta por estrelas relativamente velhas, a barra tem 27.000 anos-luz de comprimento (a distância que a luz, a viajar a 300 mil quilómetros por segundo, tem de percorrer para ir de uma ponta à outra). É maior em 7000 anos-luz do que se supunha, refere um comunicado da universidade de Wisconsin.
"Esta é a melhor prova de uma longa barra na nossa galáxia. É difícil argumentar contra estes dados", diz Benjamin. "É uma componente importante da galáxia, que basicamente permaneceu escondida até agora. Como é grande, terá grande efeito na dinâmica da parte interna da Via Láctea", refere outro membro da equipa, Ed Churchwell.
"Ninguém compreende realmente como é que as barras se formam", acrescenta. "O que sabemos é que parece haver tantas galáxias com barras que elas devem ser estáveis. Os astrónomos vão ter de arranjar algum tipo de modelo que explique a estabilidade destas estruturas."