Rodrigo Garcia regressa ao Citemor para matar e comer
Uma obra provocadora estreia-se hoje em Montemor-o-Velho
Depois de ter participado nas últimas quatro edições do Citemor, o encenador argentino Rodrigo Garcia regressa a Montemor-o-Velho para apresentar, em estreia nacional, Accidens - Matar Para Comer. Apesar de imprevisível, o espectáculo desta noite tem as marcas inconfundíveis das obras de Garcia: provocação, acidez e intransigência contra os comportamentos consumistas que caracterizam as nossas sociedades, mas desta feita com uma componente menos política e social e mais filosófica - o argentino propõe a prática do assassínio como forma de nos tornarmos mais humanos.
"Antes, matar algo era bastante normal, estava inserido num ciclo natural. Agora já tudo aparece morto, deixámos de matar para comer e encontramos as coisas já empacotadas, e embaladas", diz, explicitando que a peça é antes de mais uma metáfora "do que vamos perdendo e da forma como vamos sendo desumanizados por estilos de vida cada vez mais idênticos". Para o ser humano não perverter irremediavelmente a sua natureza, Garcia defende a recuperação de alguns hábitos predatórios: "Segundo a minha modesta opinião, não praticar o assassínio é algo que nos torna menos humanos e perverte a nossa natureza", conclui.
Apesar do ponto de partida provocatório, a peça acaba por consistir numa cena bastante simples, mais próxima da performance do que de um espectáculo teatral convencional. Estreada em Itália há poucas semanas, Accidens - Matar Para Comer é uma produção da La Carnicería Teatro, a companhia de Rodrigo de Garcia, que já apresentou, em Montemor-o-Velho, After Sun, A História de Ronald o Palhaço da McDonald"s e Compre Una Pala En Ikea Para Cavar Mi Tumba.
"As três obras têm bastantes coisas em comum e debruçam-se sobre o problema central do consumo nas nossas sociedades. Accidens, por seu turno, tem um discurso menos claro nesse sentido, é menos político. Interessa-me sobretudo criar um ambiente", defendeu o criador argentino.
O festival tem acompanhado o percurso artístico do Garcia que, desde A História de Ronald..., resultante de uma experiência de criação em Montemor, não voltou a apresentar um espectáculo teatral clássico. Garcia conta que a sua colaboração assídua com o Citemor resultou de um processo de conhecimento mútuo que levou à descoberta de afinidades: "Foi interessante porque fomo-nos conhecendo e depois foram surgindo oportunidades que permitiram prolongar a relação. Desta vez não tinha nenhuma obra nova, mas queria participar de alguma forma."
Depois de Accidens - Matar Para Comer, o cartaz do Citemor tem ainda para oferecer as estreias, em Portugal, de Roger Bernat e Jean Pierre Larroche, bem como a performance de Patrícia Portela, Flat Summer. Em Tot És Perfect (de 3 a 5 de Agosto), de Roger Bernat, um grupo de adolescentes representa um romance de cavalaria anónimo do séc. XIV, enquanto em Promenade de Tête Perdue (de 4 a 6 de Agosto), Jean Pierre Laroche se debruça sobre a lenda dos degolados de Montemor-o-Velho. Finalmente, em Flat Summer (de 10 a 12 de Agosto), Patrícia Portela procede a uma remontagem especial dos seus trabalhos anteriores, Flatland 1 e Flatland 2, tendo em vista um terceiro episódio que deverá ser apresentado mais tarde.
Accidens - Matar
Para Comer
De Rodrigo Garcia.
Com Juan Loriente.
Montemor-o-Velho. Teatro Esther de Carvalho. Hoje
às 22h30, 23h30 e 00h30.
Bilhetes a 10 euros.