Bagão explica défice de 6,4 por cento e ataca Constâncio
Ex-ministro de Santana justifica-se sobre memorando de Agosto em que estimava défice orçamental bem acima de 2,9 por cento
O ex-ministro das Finanças, António Bagão Félix, escreveu um artigo de opinião para o PÚBLICO - que será publicado na edição de amanhã - justificando por que é que, em Agosto do ano passado, elaborou uma estimativa para o défice orçamental de 2004 de 6,4 por cento.Essa estimativa não foi divulgada publicamente na altura. O Governo de então, presidido por Santana Lopes, comprometeu-se a apresentar um défice abaixo dos três por cento estipulados no Pacto de Estabilidade da Zona Euro.
Bagão escreveu, no artigo de opinião, que esse era um "valor estático" do défice - ou seja, o valor atingido se o Governo não tomasse quaisquer medidas para o corrigir.
No mesmo artigo, Bagão Félix ataca o actual Governo e o governador do Banco de Portugal, Vítor Constâncio, acusados de "desonestidade política". Bagão critica a estimativa recentemente apresentada pela comissão Constâncio para o défice de 2005, de 6,83 por cento.
O ex-ministro escreve que "levar às centésimas uma estimativa" é "ridículo" e acusa o Governo e Constâncio de um "espanto serôdio".
O artigo de Bagão Félix é o segundo episódio numa polémica iniciada ontem com a divulgação de que o Governo anterior dispunha da estimativa de 6,4 por cento para o défice de 2004.
O Diário de Notícias publicou na sua edição de ontem um memorando enviado por Bagão Félix a Santana Lopes, onde avançava o tal "valor estático" de 6,4 por cento para o défice do sector público administrativo em 2004. Foi o próprio ex-primeiro-ministro a promover a divulgação deste memorando.
O então ministro das Finanças explicava nesse documento ao então chefe do Governo porque é que a estimativa do défice atingia esse valor, e propunha uma série de medidas (incluindo a realização de receitas extraordinárias) para colocar o défice abaixo dos três por cento. Mesmo com essas medidas, restaria um valor entre 0,6 por cento e 0,8 por cento do PIB descrito como "falta", para o qual "haverá que encontrar uma solução".
Estes números foram debatidos num conselho de ministros extraordinário em Évora, durante o qual alguns ministros se pronunciaram pela divulgação pública da estimativa de 6,4 por cento - entre os quais Paulo Portas (Defesa), António Mexia (Obras Públicas) e o próprio Bagão. O Governo optou, contudo, por não comunicar à nação as contas de Bagão Félix.
O Executivo de Santana Lopes elaborou então um orçamento para 2005 com base em pressupostos que não se irão concretizar - por exemplo, um crescimento do PIB português em 2005 na ordem dos 2,4 por cento.
No seu artigo de opinião, Bagão defende-se dizendo que esse número estava "dentro do estimado por organizações internacionais sempre tão encomiasticamente referenciadas".
Contactada pelo PÚBLICO, a ministra das Finanças do Governo de Durão Barroso, Manuela Ferreira Leite, escusou-se a prestar declarações sobre o memorando divulgado pelo DN, considerando-o "insusceptível de comentários".
Pedro Santana Lopes também não prestou directamente declarações sobre este assunto. Mas fez saber ao PÚBLICO que discorda da interpretação que o DN fez do documento, de que teria "ignorado" o défice; e que não considera que a divulgação do memorando seja uma crítica a Ferreira Leite.
Mais comentários, Santana Lopes reservou-os para depois de receber uma resposta ao repto que lançou ao governador do Banco de Portugal, Vítor Constâncio - a quem desafiou, através da imprensa, a fazer um cálculo para o défice real de 2004 nos mesmos moldes em que apresentou ao actual Governo uma estimativa para o défice de 2005.
Artigo de Bagão Félix amanhã no PÚBLICO sobre polémica do défice