Jacques Chirac cumpre hoje 10 anos de Eliseu
O Presidente francês comanda o leme de um país atolado no marasmo económico e vê dois terços
dos eleitores a julgarem severamente a sua acção política. Por Ana Navarro Pedro, Paris
O décimo aniversário da entrada de Jacques Chirac no Eliseu será celebrado hoje com a mesma discrição que os 10 anos da sua primeira eleição, a 7 de Maio. Com um balanço mais do que contrastado destes 10 anos de exercício do poder, e ameaçado por uma derrota, que lhe seria fatal, no referendo de 29 de Maio sobre o tratado de Constituição europeia, o Presidente francês opta por um perfil baixo. Em diversas sondagens, os franceses confessaram que a tentação pelo "não" ao projecto europeu, a 29 de Maio, é parcialmente motivada pelo desejo de dizerem "não" à política de Chirac - mesmo se esta tentação parece ceder terreno, nos últimos dias, a um deslize da atenção pública para o texto do tratado constitucional. A decepção dos franceses é, no entanto, proporcional às expectativas que Jacques Chirac criava há 10 anos.
Num discurso célebre de 17 de Fevereiro de 1995, o candidato que parecia então derrotado de antemão lança uma ideia emblemática sobre a "fractura social" que será o ponto de viragem da campanha presidencial, até então dominada por Edouard Balladur, à direita, e Lionel Jospin, à esquerda. "Não aceito ver tantos jovens desempregados (...) Não aceito ver quase um milhão dos meus compatriotas obrigados a viverem com o RMI [rendimento mínimo de inserção] (...) Não posso aceitar uma situação onde uma criança em cada duas entra no ciclo preparatório sem perceber o que lê (...) Recuso uma política do alojamento que, mesmo sem ser social, não é capaz de dar um tecto a todos os franceses".
A 7 de Maio, Jacques Chirac é eleito com 52,6 por cento dos sufrágios. A juventude aclama-o na rua, num clima de loucura e de euforia, tão mais alegre quanto o fim de reinado do socialista François Mitterrand era penoso e sombrio. Mas 10 anos depois, a taxa de desemprego da população activa é ainda de 10,2 por cento, contra 11,6 por cento em 1995. Os franceses com menos de 25 anos sofrem com uma taxa de desemprego de 23,1 por cento, contra 27,4 por cento há 10 anos. No mesmo período, o número de franceses que recebem o RMI passou de 946 mil para 1,22 milhões. Paralelamente, os grandes projectos de reforma da educação nacional foram abandonados, e a única reforma importante destes 10 anos, adoptada já em 2005, é alvo de uma contestação quase permanente dos alunos e dos professores.
A ruptura entre Chirac e a opinião pública data da reforma da segurança social, apresentada em 1995 pelo primeiro-ministro Alain Juppé. O texto é rejeitado por todo o país e uma greve de protesto paralisa a França durante cinco semanas, em pleno Inverno. Em 2002, as promessas não cumpridas sobre a "fractura social" quase lhe custaram a sua reeleição - mais ainda do que os inúmeros escândalos de corrupção política que começaram colar então ao Presidente. Mas a passagem do líder de extrema-direita, Jean-Marie Le Pen, à segunda volta das presidenciais criou um terramoto político no país e levou 82 por cento dos franceses a votarem em Chirac.
Popular na frente internacionalNestes dez anos de mandato, Jacques Chirac conheceu apenas três grandes picos de apoio da opinião pública e foi sempre em questões internacionais. Uma deles foi até desportiva, já que a euforia com a vitória da França no Campeonato do Mundo de futebol, em 1998, deu um impulso importante à popularidade do Presidente Chirac. Houve um novo pico de apoio dos franceses depois dos atentados do 11 de Setembro 2001, quando Jacques Chirac foi o primeiro chefe de Estado a ir aos EUA exprimir a sua simpatia ao seu homólogo americano, George Bush. Por fim, o Presidente Chirac conquistou a gratidão e a admiração dos seus compatriotas ao assumir a liderança da frente de recusa à intervenção militar americana no Iraque.
Foi neste papel, de líder da independência francesa em relação ao aliado americano, que Jacques Chirac se tornou mais popular - uma simpatia da opinião pública que explica a sua popularidade ainda hoje, quando a política do seu governo é profundamente impopular. A sua oposição à guerra no Iraque granjeou-lhe também simpatias na cena internacional, nomeadamente nos países árabes. Curiosamente, a sua primeira grande decisão, em 1995, quase provocara um boicote internacional da França: o recomeço dos testes nucleares franceses no atol de Moruroa foi então alvo de uma desaprovação generalizada.
Segundo uma sondagem CSA, 26 por cento das pessoas interrogadas têm uma "opinião positiva" destes 10 anos da presidência de Jacques Chirac, contra 57 por cento que dizem ter uma "opinião negativa". O balanço parece-lhes particularmente negativo na "redução das desigualdades" (76 por cento).