Presidente do STJ critica proposta de redução das férias judiciais
"Se a questão das férias judiciais fosse realmente para levar a sério, não seria pela óbvia falta de diálogo que o poder Executivo estaria a comprar uma guerra que a magistratura judicial não deseja, mas que vende barata", declarou Nunes da Cruz, no discurso da cerimónia de posse como presidente do STJ.
Segundo Nunes da Cruz, "ciclicamente o poder político – o poder executivo em especial – vem a terreiro reparar nas férias judiciais e declarara a necessidade de estabelecer uma espécie de equidade em relação à regra geral do Estado, com o pretexto de serem recuperados atrasos processuais". Contudo, afirma, a ideia é avançada sem ter em conta a especificidade do trabalho judicial, realizado muitas vezes fora do horário de expediente, mas também aos fins-de-semana e durante férias.
"Face a tantas medidas que já estiveram tantas vezes anunciadas e outras tantas goradas, a redução das férias judiciais é pouco, é muito pouco". "Se os defensores da solução não vêem nela uma boa dose de populismo e demagogia, não deixarão de reconhecer, pelo menos, que ela aparece isolada entre inexplicáveis silêncios sobre tanto que fazer. Só poderá colher – se é que colhe – junto dos cidadãos mais alheados destas coisas", sublinhou.
Se o Governo quiser dialogar sobre a questão, Nunes da Cruz revelou que irá recordar que o tema das férias judiciais "já foi escalpelizado até à exaustão no passado, está gasto" e "o que há a fazer não passa pela falsa questão das férias”. "Se quiserem dialogar, será para voltarmos às coisas realmente grandes, às medidas de fundo, que vão aguardando pelas calendas, ano após ano, orçamento após orçamento, legislatura após legislatura", acrescentou.
Nunes da Cruz salientou que o dado central da morosidade na Justiça está no "número assustador e crescente de processos actualmente distribuídos", sendo também uma evidência a "necessidade de criar outras estruturas destinadas a receber e decidir sobre determinado tipos de processos, caracterizados pela sua especificidade".
Além destas preocupações, indicou como prioridades assuntos já discutidos como a "reforma do mapa judicial do território nacional, a redistribuição de tribunais e o redimensionamento dos quadros de magistrados, a par da criação de uma bolsa de juízes".
"Falando de justiça, não é justo distribuir a um juiz cinco mil processos e manter outro com 500. É urgente consagrar a contingentação de processos [número limitado de casos por juiz]", declarou.