Papa celebra hoje missa na grande Pradaria dos Santuários de Lourdes

Proclamação da Imaculada Conceição seguiu-se à da padroeira de Portugal, por D. João II, na restauração da independência

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O Papa esteve ontem na gruta de Bernardette, em Lourdes Alessandro Bianchi/EPA

A 104ª viagem do Papa João Paulo II fora de Itália tem como objectivo celebrar os 150 anos da proclamação do dogma da Imaculada Conceição, feita em 8 de Dezembro de 1854 pelo Papa Pio IX e à qual a pressão feita por Portugal não é alheia. Mas este dogma, que quer dizer que a mãe de Jesus foi concebida sem pecado original, acentuou o fosso dos protestantes em relação ao modo como a Igreja Católica encara a figura da Virgem Maria.

Durante séculos, muitos debates sobre o tema foram sendo produzidos pelos teólogos. Popularmente, ela era plenamente santa - expressão com que ainda hoje é definida pela Igreja Ortodoxa, mas sem chegar ao carácter dogmático. Mas grandes teólogos como S. Bernardo, S. Tomás de Aquino ou S. Boaventura evitaram encarar a contradição do modo de ver tradicional: se Jesus é o salvador de toda a humanidade, como pode a sua mãe ter sido salva por ele?

Com o passar dos tempos, e muito antes da definição como artigo de fé, foi ganhando a opinião segundo a qual a mãe de Jesus não conhecera o mal. A questão foi dirimida, explica-se na enciclopédia "Théo", pelo teólogo escocês Duns Scott, no século XIII, que propôs a ideia de uma redenção "antecipada" do filho em favor da mãe. Este argumento estaria, seis séculos mais tarde, na base da definição dogmática.

Pelo caminho, e entre muitas outras iniciativas e argumentações, Portugal também foi protagonista do debate. Em 1645-46, após a restauração da independência, D. João IV propôs nas cortes de Lisboa que a Imaculada Conceição fosse consagrada como padroeira do reino. Prometendo pagar anualmente 50 cruzados de ouro ao santuário de Vila Viçosa, o primeiro na Península Ibérica com aquela invocação, o rei garantia ainda defender sempre, mesmo com a vida, que a Virgem Maria fora concebida sem pecado original. Esta decisão foi também uma forma de conseguir apoio da Santa Sé para a causa independentista portuguesa e, em Maio de 1671, o Papa Clemente X confirma a escolha da padroeira de Portugal.

A proclamação do dogma servirá ainda outros objectivos: no contexto da unificação italiana, e após a definição dogmática da infalibilidade pontifícia, a afirmação desta nova verdade da fé servia também como forma de o Papa afirmar, sem ambiguidades, a infalibilidade ligada ao seu ministério.

Menos de quatro anos depois desta decisão de Pio IX, a tradição católica foi como que "confirmada" nas aparições de Lourdes. Em 25 de Março de 1858, a jovem Bernadette Soubirous ouviu a visão responder à pergunta sobre a sua identidade, no dialecto local: "Que soy era Immaculada Councepciou!"

É toda esta ideia que João Paulo II está a celebrar em Lourdes. Pela segunda vez no santuário (a primeira foi em 1983), o Papa vai à cidade dos Pirinéus franceses como um doente entre milhares de outros que, todos os anos ali procuram alívio. O que não é estranho também à sua devoção mariológica: nas suas viagens, João Paulo II visitou santuários marianos importantes como Czestochowa (seis vezes), na Polónia, Guadalupe (México) e Loretto (Itália), ambos quatro vezes, e Fátima (três vezes).

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