Crianças deficientes fazem terapia com cavalos
As crianças e adultos que participaram nos cursos de hipoterapia e equitação adaptada, proporcionados pela Câmara Municipal da Trofa, mostraram há dias aos familiares e à comunidade o que, uma vez por semana, costumam fazer no picadeiro do Centro Equestre local. Foi uma manhã de boa-disposição em que transpareceu a alegria dos utentes por montarem os cavalos. "Eles ficam excitados quando sabem que chegou o dia da hipoterapia e nota-se que adquirem mais acalmia e descontracção. Do ponto de vista da comunicação, é notório que há uma melhor comunicação para o exterior. É um trabalho complementar ao que fazemos na associação", sintetizou Maria da Conceição Leitão, coordenadora pedagógica da Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão com Deficiência Mental (APPACDM), que tem inscritos 28 alunos no curso de hipoterapia."O movimento do cavalo a passo provoca um balancear que permite inibir padrões patológicos neuromotores", vincou Cláudia Adães, coordenadora do Gabinete Municipal de Acompanhamento Psicológico e Pedagógico (GMAPP), responsável pela programação das aulas desde 2001. Além das sessões de hipoterapia, são ministradas aulas de equitação terapêutica e equitação adaptada.Este gabinete da autarquia é constituído por quase três dezenas de técnicos - psicólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e diversos monitores - e coordena uma serie de acções de formação profissional e de auxílio ao desenvolvimento das crianças e idosos. Os técnicos percorrem o concelho de lés-a-lés para verificar a existência de problemas sociais e para os quais procura arranjar solução. Por vezes, por indicação dos professores, médicos de vários pontos do Norte e pela auscultação de pais, o gabinete concede que a melhor forma de "tratar" uma criança é inseri-la nas aulas com cavalos. Por isso, além dos utentes da APPACDM, comparecem no Centro Equestre da Trofa crianças com necessidades educativas especiais ou que necessitam de adquirir equilíbrio motor. Da Trofa ou de outros concelhos. É o caso de Renata Luís, uma menina com nove anos de idade, que passou para o quinto ano de escolaridade mas que, desde nascença, tem um problema de equilíbrio. Ninguém diria, dado o seu à-vontade a cavalgar; retira as mãos dos apoios, deita-se sobre o lombo do cavalo e ainda consegue distribuir acenos aos presentes. "A Renata anda em bicos-de-pés. Já foi operada, faz fisioterapia e sessões de psicologia, mas do que ela mais gosta é dos cavalos ", garante a avó, Maria Albertina Amaral, que só para ver a alegria da neta deita para trás das costas o cansaço da viagem na tortuosa estrada entre Vila do Conde e a Trofa."Ela gosta imenso de equitação e até tive de lhe comprar uma fatiota para isso", conta. De facto, Renata não se cansa de distribuir sorrisos a novos e velhos, mas foi para o cavalo que destinou os afagos mais ternurentos. O "Joel", um puro Lusitano, retribui com um meneio da cabeça, num exemplo de empatia entre cavalo e cavaleiro.Os animais envolvidos nas aulas "têm características especiais", explicou ao PÚBLICO Beata Wiecha, uma engenheira zootécnica de origem polaca que trabalha no centro. "Utilizámos cavalos já com alguma idade e com um temperamento calmo. De início, os cavalos são treinados para não se assustarem com os sons dos cavaleiros. É que algumas das crianças não conseguem falar e apenas gritam. Depois disso, os cavalos cumprem a missão de ajudar as crianças", concretiza. Entre os tratadores que trabalham com Beata Wiecha, encontra-se José Fernando, com 20 anos de idade, "um caso de sucesso" do trabalho feito pelo GMAPP, reconhece Cláudia Adães. O jovem frequentava uma escola EB 2,3, onde denotava graves problemas de convivência e insucesso escolar. Quando chegou ao Centro, "tinha medo dos cavalos e dos picadeiros". Fez o curso de tratador e hoje tem um emprego de que diz "gostar imenso". Ao todo, participaram neste ano lectivo nas actividades equestres 68 crianças e jovens oriundos dos concelhos da Trofa, Marco de Canaveses, Gondomar, Santo Tirso e Vila do Conde. "Vamos continuar a apoiar este projecto [a autarquia custeia as aulas e a ocupação do Centro] e não olhamos para a origem dos utentes. Somos um concelho novo [a Trofa tem cinco anos] e queremos dar o exemplo. Fazer de tudo para que as crianças estejam escandalosamente felizes", frisou o presidente da câmara, Bernardino Vasconcelos.Nas instalações do Centro Equestre, funcionam ainda diversos cursos de formação profissional nas áreas de cerâmica, jardinagem, pintura, arraiolos e bordados. Alguns dos frequentadores são de etnia cigana ou oriundos de países de Leste cuja inserção social é um dos objectivos do GMAPP.