Publicada a primeira comparação de cromossomas humanos e de chimpanzé

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Os padrões de actividade dos genes podem ser o que separa os homens e chimpanzés Colin Braley/Reuters

Agora que a sequenciação do genoma humano e do chimpanzé estão terminadas, os cientistas têm à disposição, pela primeira vez na história, os imensos livros escritos no alfabeto de quatro letras (A, C, G e T, as iniciais dos nucleótidos ou bases que compõem o ADN) com as quais se escrevem os genes, de várias espécies. Podem fazer leituras de comparação, em busca de diferenças que tenham um significado evolutivo - como um gene fundamental para o desenvolvimento da linguagem, que esteja presente nos homens mas não noutros animais. Uma pequena diferença pode chegar para que a ordem de fabrico de uma proteína, contida no gene, se modifique, produzindo uma molécula com propriedades diferentes, por exemplo.

O que a vasta equipa composta por investigadores do Japão, da China, de Taiwan e da Alemanha relata hoje na revista "Nature" é a análise comparada do cromossoma 22 do chimpanzé ("Pan troglodytes") com o cromossoma 21 humano ("Homo sapiens sapiens"), que é o seu equivalente, e é sede de várias mutações genéticas associadas com doenças, como a trissomia 21, também designada "síndrome de Down".

Os números não coincidem precisamente porque o património genético humano está contido em 23 pares de cromossomas, enquanto os outros grandes símios, como o chimpanzé e o gorila, têm 24 pares. Mas o cromossoma humano 2 - o segundo maior - parece resultar da fusão de dois outros cromossomas de médias dimensões, ocorrida há cerca de seis milhões de anos, quando se pensa que as linhagens de humanos e chimpanzés divergiram.

A busca de diferenças era o principal objectivo dos investigadores. Mas o que encontraram não foi uma história simples, mas antes dados que aprofundam ainda mais o enredo da nossa relação com os chimpanzés. "É bastante claro que as diferenças no genoma entre humanos e chimpanzés são muito mais complicadas do que o senso comum vulgarizou", comentou à agência Reuters Asao Fujiyama, do Centro de Ciências Genómicas Riken, em Yokohama, no Japão.

A equipa chegou à conclusão de que apenas 1,44 por cento do ADN dos dois cromossomas diferia, ao nível de alterações numa única letra do código genético - uma espécie de gralhas do texto, que nos humanos estão relacionadas com diferenças na susceptibilidade a determinadas doenças, por exemplo.

Mas os investigadores descobriram diferenças que podem ser mais determinantes do que estas gralhas genéticas. Detectaram um número impressionante (68.000) de extensões de ADN, muito pequenas ou de tamanho razoável, que foram perdidas ou ganhas por uma das espécies, e que os cientistas designam colectivamente como "indels", usando as letras iniciais de inserção ou delecção. "Estas diferenças chegam para gerar modificações na maior parte das proteínas", dizem os investigadores na "Nature".

De facto, dos 231 genes funcionais (que comandavam a produção de proteínas) que puderam ser comparados entre humanos e chimpanzés, 83 por cento tinham diferenças de código. "Os nosso dados sugerem que 'indels' nos genes representem um dos principais mecanismos geradores de diversidade de proteínas que dão forma às espécies de grandes primatas."

Esta conclusão contraria uma ideia que se tem tornado comum entre os cientistas: a de que a maioria das diferenças genómicas entre chimpanzés e humanos se encontrariam nas grandes extensões de ADN repetido, que parece ser blá-blá genético, sem codificar a produção de proteínas. Mas, pelo menos na análise dos cromossomas 21 humano e 22 do chimpanzé, isso não se verificou. "Surpreendentemente, as diferenças na sequência nos genes que codificam a produção de proteínas não são muito mais comuns do que nas regiões genómicas não codificantes", escreve Jean Weissenbach, do Genoscope francês, num comentário ao trabalho publicado também hoje na "Nature".

Para além das diferenças no código genético, os cientistas interessaram-se também por estudar a actividade dos genes, para verificar se encontravam diferenças. Estudando a activação dos genes no fígado e no cérebro, os investigadores concluíram que 20 por cento apresentavam diferenças estruturais significativas, consoante analisavam tecidos de humanos ou de chimpanzés.

Uma vez que o cromossoma 22 representa apenas um por cento do genoma dos chimpanzés, o número total de genes com níveis e padrões de actividade diferentes dos dos humanos pode atingir os milhares. Isto torna muito mais difícil tentar descobrir o que torna os humanos únicos.

"Ao procurar as bases da variação física entre homens e chimpanzés, as diferenças na sequência dos genomas são apenas o princípio: precisamos de saber o que significam essas mudanças. Muitas podem não ter qualquer efeito", sublinha Weissenbach. Não se trataria, assim, de procurar os genes que nos tornaram diferentes dos chimpanzés, mas das pequenas diferenças de funcionamento que desencadearam grandes modificações - algo como o resultado inesperado de um acto de um viajante no tempo que, ao pisar uma borboleta no passado, muda o curso da história.

Para tirar dúvidas, talvez não fosse despropositado procurar um terceiro elemento de comparação, diz o cientista francês: "Será que não precisaremos do genoma do gorila para iluminar as questões suscitadas pela comparação dos genomas dos humanos e do chimpanzé?"

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