Punição de agressores sexuais sem tratamento "é a mesma coisa que nada"
Punir os agressores sexuais sem que se proceda ao seu tratamento "é a mesma coisa que nada", defendeu ontem Rui Abrunhosa, do Departamento de Psicologia da Universidade do Minho (UM). Mais: esta via - punir sem tratar -, que é a que tem sido seguida, "sai mais cara" ao Estado. "A maior parte destes indivíduos têm o seu trabalho, o seu emprego, dão meios de subsistência à família, são socialmente produtivos", mas se não forem tratados e controlados a probabilidade de reincidirem e voltarem à prisão é bastante elevada, sustentou aquele especialista, que coordena a Unidade de Consulta em Psicologia da Justiça na UM, numa conferência proferida durante as Jornadas de Estudos Penitenciários da Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa. "Se cometeram um crime têm de cumprir uma pena, mas só isso de pouco vale", insistiu.Desde que em 1998 a Unidade de Consultas da UM foi criada, terão passado por ali "uma meia dúzia de agressores sexuais", encaminhados, nomeadamente, pelo instituto de reinserção social - poucos, reconhece Rui Abrunhosa, porque "a maior parte destes agressores vai preso, cumpre uma pena de prisão, sai cá para fora sem qualquer tipo de tratamento e acaba-se o processo", criticou, mais tarde, em declarações ao PÚBLICO. Estas pessoas, segundo explicou durante o encontro, "não são necessariamente doentes, no sentido médico", mas em muitos casos indivíduos que se relacionam de uma forma inapropriada com os outros e que respondem de forma sexual a estímulos que nada têm de sexual. Contudo "não se pode pôr no mesmo saco diferentes tipos de agressores sexuais", nem tratar da mesma forma delinquentes, violadores ou agressores de crianças.Sabe-se que nos casos dos psicopatas, por exemplo, "o tratamento é muito pouco eficaz, que a punição tem de ser forte e o controlo absoluto". De resto, o grau de tratabilidade varia de indivíduo para indivíduo e em função de diversos outros factores. "Hoje sabemos que a probabilidade de reincidência é enorme nos agressores com mais de 40 anos, mesmo que aparentemente haja sucesso nestes programas, e menor nos jovens."Mesmo assim, apesar de a intervenção com este tipo de público ser lenta e de em "muito casos o sucesso não existir" de todo, o tratamento é "um direito e um dever" de todos os que se preocupam com o bem estar social e a segurança em geral, defendeu Rui Abrunhosa. "O grande enfoque, de facto, tem de ser o tratamento e o controlo", argumentou mais tarde, explicando que este último tanto pode ser feito pelo próprio (a quem, no tipo de programas desenvolvidos na UM, são ensinados mecanismos de prevenção da recaída), pela família (que pode ver, por exemplo, se o indivíduo com antecedentes "está a usar 'sites' pornográficos na Internet outra vez, o que pode ser um sinal de que está a desestabilizar"), ou, em última instância, mediante as pulseiras electrónicas.Abrunhosa fez saber que na próxima semana deverá entregar na Direcção-Geral dos Serviços Prisionais uma proposta que visa a criação de "um programa de intervenção para agressores sexuais em meio prisional". A ideia, concretizou, é "dar formação específica a um conjunto de técnicos para que eles próprios possam intervir junto dos delinquentes sexuais e depois ir monitorizando à distância como é que eles vão implementar o programa".Instigado pelo Procurador-Geral da República, Souto Moura, que serviu de presidente da mesa do painel no qual participou Rui Abrunhosa, o especialista pronunciou-se ainda sobre a castração química. "Sou contra. O problema do sexo é um problema de cabeça", disse. "A maior parte dos delinquentes sexuais têm níveis de testosterona iguais aos nossos, não precisam da castração química para nada."