Campo pequeno

"A Casa de Campo" é o calvário de uma família a caminho da purificação: ele tem que poder voltar a ser o homem da casa, ela tem que ser castigada pelo seu quase pecado original (não será por acaso que há serpentes a aparecer na casa dos Tilson). Ainda não se disse que é um "thriller", embora a nova casa de campo desta família pareça, desde o primeiro minuto, estar assombrada. E não há tanto fantasmas quanto um anjo exterminador no corpo transbordante de Stephen Dorff. Ex-presidiário, chega para reclamar a casa que foi sua e que perdeu para os Tilson - e é por ele que uma família chegará à redenção.

Ainda não se disse, também, que é um filme do britânico Mike Figgis, o que permitirá identificar temas caros à sua filmografia - a tensão sexual que envolve as personagens, erotização da figura feminina, questões de rivalidade e afirmação masculina.

Mas, entre o cineasta de estúdio inspirado ("Leaving Las Vegas" ou "One Night Stand") e o experimentador de formas (nomeadamente, pela utilização do digital e pelas pesquisas narrativas que constituem os seus dois últimos filmes, "Timecode" e "Hotel", ambos inéditos comercialmente em Portugal), dificilmente se reconhece Figgis em "A Casa de Campo".

Assumindo o retorno a uma lógica "mainstream", diz Figgis que lhe apetecia trabalhar dentro de um género - o "thriller" -, tentando, ao mesmo tempo, manter-se fiel ao que o caracteriza e introduzir novos elementos. O resultado está entre o estereótipo e a paródia. Ou seja, tratando-se de um "thriller" psicológico (devedor de "O Cabo do Medo", de Scorsese, e a presença de Juliette Lewis não desmente), está constantemente a tentar a tangente ao cinema de horror e a um imaginário gótico, exibindo um catálogo de "clichés". Por outro lado, o que se presume involuntário, parece embarcar na ironia quando, por exemplo, os actores irrompem num coro de gritos excessivos, uns para os outros (como se estivéssemos a ver alguém a dizer-lhes: "Agora, gritem..."), ou na forma como Stone e Quaid investem sobre o psicopata de Dorff (resumindo: uma corda e... "Jeronimoooo!") Por fim, Figgis faz da personagem de Quaid um realizador de documentários, que é o seu pretexto para incluir no filme uma mini-câmara digital e imagens no mesmo suporte - os tais "novos elementos" -, que têm servido de caução "experimental", pelo menos, desde "Beleza Americana".

E porque o nome de Sharon Stone ainda é capaz de dizer muito a muita gente e porque ainda há quem espere qualquer coisa como um regresso: entre "understatement" ou simples inadequação (Stone não está, definitivamente, perfilada para o papel de mãe), é mesmo um caso de "miscasting". Isto é, se déssemos por Stone no filme. Não se importam de esperar mais um pouquinho?

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