Banco de Portugal envia processo do Central Banco para o Ministério Público

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Em causa estão actos que, ao abrigo da lei bancária, foram já punidos como "infracção especialmente grave" e que impedem os ex-administradores do CBI de exercer funções de gestão em instituições de crédito durante um período máximo de até sete anos. Isto, para além de terem sofrido sanções pecuniárias, que no caso de Tavares Moreira são superiores a 200 mil euros.

"O Banco de Portugal cumpre sempre as suas obrigações legais." Foi esta a resposta do organismo de supervisão bancária, quando questionado pelo PÚBLICO se teria, ou não, comunicado ao Ministério Público (MP) os factos apurados no decurso da investigação ao CBI, para que este conclua se existe matéria criminal, pois trata-se de crimes públicos.

O PÚBLICO apurou que o MP está já na posse de cópia do inquérito ao CBI levado a cabo pelo BP, com a colaboração da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), iniciado no segundo semestre de 2002. Entre outros pontos, o BP concluiu que os ex-gestores do banco terão prestado declarações falsas à supervisão, assim como manipulado e falsificado as contas do CBI, de forma a ocultar prejuízos de cerca de 25 milhões de euros em 2000 e 2001, com recurso a sociedades "off-shore" ligadas ao banco, uma operação que envolveu cerca de 31 milhões de euros. "Não comentamos, pois cabe ao BP fazê-lo", responderam da Procuradoria Geral da República. A PGR poderá agora enviar o processo para o Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) .

Comunicação invulgar

A comunicação do BP ao Ministério Público é invulgar, na medida em que a autoridade de controlo adopta, em regra, uma conduta "soft" na sua actuação de supervisão, não se conhecendo outros casos semelhantes. Esta situação complica-se ainda mais quando surgem associados à instituição investigada, o CBI, dirigentes do PSD e do PS. Tavares Moreira é deputado e porta-voz do PSD para a área económica e foi governador do BP, enquanto o seu ex-vice-presidente no Central Banco, José Lemos, é dirigente socialista e é dado como estando ligado à estrutura financeira do PS. A actuação do BP decorre do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras, bem como do Código do Processo Penal, que impõem o dever de informação ao MP sempre que se verifiquem factos em que se presume que possa haver responsabilidade criminal.

Os ex-administradores do CBI indiciados (José Lemos, Nuno Contreras de Oliveira, vice-presidentes, Miguel Contreras de Oliveira, Edgar Proença, Luís Marques, Augusto Martins e Luís Lagarto e Tavares Moreira) abandonaram funções no segundo semestre de 2002, após terem sido desencadeadas as investigações. No final desse ano, o BP decidiu, depois da CMVM ter obrigado o CBI a repor a veracidade das contas, abrir um processo de contra-ordenação ao banco, cujas conclusões foram esta semana divulgadas.

Tavares Moreira, que em Abril de 2002 pediu a suspensão das funções de presidente do banco, para assumir o lugar de deputado do PSD, foi punido de formo pouco usual, o que surpreendeu o mercado financeiro. Para além de ter de pagar uma multa superior a 200 mil euros, fica inibido de exercer funções de gestão em instituições de crédito durante os próximos sete anos, ou seja, altura em que celebrará os seus 66 anos. Trata-se da maior sanção pecuniária aplicada a um banqueiro português.

Foi em vão que o PÚBLICO tentou falar com Tavares Moreira para obter um comentário sobre os factos de que é acusado. Porém, o deputado social-democrata já afirmou que vai recorrer da decisão da supervisão, o que poderá fazer nos 15 dias úteis seguintes à sua notificação, e que está disposto a manter as suas funções de porta-voz do PSD, no que parece ser apoiado pela direcção do partido do Governo.

O ex-governador do BP alegou não ter responsabilidades, pois na altura em que se materializou a operação de rearranjo das contas para compor o balanço era presidente sem funções executiva. No entanto, é acusado de ser "o seu autor material", pois terá sido ele que, em 2001, autorizou a venda de uma carteira de acções a entidades não residentes, que inclui títulos de 13 empresas, entre elas a Pararede, a CBI, a PT, a Teixeira Duarte, a um valor superior ao do mercado. As "off-shore" financiaram a compra das acções, recorrendo a um empréstimo da UBS, que é concedido mediante uma garantia do CBI. É esta operação que indicia a existência de um parqueamento das acções não declarado ao BP e o não provisionamento da garantia, o que permitiu ao CBI esconder prejuízos nos exercícios de 2000 e 2001.

Os restantes membros da administração sofreram também sanções, embora menos graves que as aplicadas a Tavares Moreira. José Lemos admitiu já poder vir a recorrer da decisão. Não foi possível ao PÚBLICO entrar em contacto com este responsável, apesar de ter deixado vários recados no seu telemóvel.

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