Perfil de Rui Teixeira: Reservado, desportista e com um escândalo entre mãos
Se não fosse juiz do chamado "processo da Casa Pia", Rui Miguel de Castro Ferreira Teixeira não teria sido obrigado a interromper o treino que faz todos os dias, pontualmente, às oito horas da manhã, num ginásio de Lisboa. Se não lhe tivesse sido distribuído o caso mais mediático dos últimos anos em Portugal, ele permaneceria no anonimato e o seu nome seria apenas o de mais um magistrado igual a tantos outros. Mas, aos 35 anos, Rui Teixeira, juiz no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa (TIC), ficou, inesperadamente, com o processo do maior escândalo dos tempos recentes entre mãos. De forma irreversível, o seu nome foi lançado para as páginas dos jornais e para os noticiários televisivos.Filho de um advogado lisboeta que se tornou conhecido pelas suas posições conservadoras durante as lutas estudantis, o magistrado tem feito todos os esforços para salvaguardar a sua vida privada. Mas o sossego das suas rotinas diárias terminou. A urgência de notícias levou os jornalistas a procurá-lo e a esperá-lo a todas as horas e a curiosidade pública concentrou todos os olhares sobre ele. Rui Teixeira resolveu interromper os seus treinos de culturismo quando começou a ter de enfrentar uma concentração de jornalistas que o esperava, de manhã bem cedo, à porta do ginásio, logo que se tornou público que fora dele a decisão de prender Carlos Cruz preventivamente. Só após lhe ter sido recentemente concedida segurança pessoal é que resolveu retomar a prática do exercício físico antes de iniciar as grandes "maratonas" que costuma realizar no tribunal a despachar processos e a ouvir arguidos. Diz quem o conhece que muito lhe deverá ter custado não treinar naqueles dias, atendendo ao seu gosto antigo pela prática desportiva. Se não fosse o caso que agora o tornou célebre, o seu estilo informal e o seu porte desportivo que constituem, aliás, uma das suas principais características, continuariam a passar despercebidos e nunca lhe valeriam as críticas que tem recebida. Rui Teixeira parece, no entanto, ser indiferente aos comentários e mantém o seu estilo próprio a que os outros magistrados que trabalham com ele no TIC (onde foi colocado em 2001) já se habituaram. Chega de moto e anda, habitualmente de jeans e t-shirt. Não falha aos treinos, agora acompanhado por dois corpulentos seguranças que afastam a hipótese de qualquer um se aproximar, à entrada no ginásio. No balneário reage com um ligeiro sorriso às piadas grosseiras que se ouvem habitualmente após o exercício. "Mas vê-se que não gosta", diz um dos frequentadores. No TIC, a opinião geral é de que é um magistrado trabalhador e ambicioso. São qualidades que lhe reconhecem desde a sua colocação no tribunal de Mafra onde viveu, na "casa dos magistrados." Henrique Martins, secretário do tribunal, tem "boa ideia" do magistrado com quem trabalhou cerca de um ano e meio. "Era um homem simples, dedicado e trabalhador", diz. "Introvertido, reservado, nunca falava da sua vida pessoal." No local de trabalho resume-se a uma atitude profissional e não dá a conhecer aspectos da sua vida privada. Os que o conhecem mais de perto sabem que é divorciado, tem um filho, vive nos arredores de Lisboa e confirmam que é um homem reservado que "não gosta de protagonismos." Asseguram que é "destemido e frontal" e tem o costume de comunicar pessoalmente aos arguidos as decisões que sobre eles toma Aos colegas que elogiam claramente a sua "competência" e "capacidade de trabalho", juntam-se outros que se interrogam sobre a existência de "alguma precipitação" nas suas decisões. Rui Teixeira validou a investigação do Ministério Público ao ordenar a prisão preventiva, primeiro de Carlos Silvino, e depois de Carlos Cruz, Ferreira Diniz, Hugo Marçal e Jorge Ritto. Em relação a todos estes nomes, o juiz considerou existirem indícios suficientes para aplicar a mais grave medida de coação - a privação da liberdade. Se, no entender de alguns, esta foi uma posição "corajosa", segundo outros foi a posição de um juiz "fundamentalista e desequilibrado", cuja actuação "atenta contra a Constituição da República Portuguesa."Antes do "processo Casa Pia" já tinha apreciado um outro processo que também envolvia figuras públicas, durante o governo de António Guterres. O que opôs Manuel Maria Carrilho, então ministro da Cultura, a António Barreto, autor de uma crónica no Público, que Carrilho considerou difamatória da sua pessoa. Rui Teixeira decidiu pela não pronúncia do arguido ( considerando que este não tinha de ir a julgamento) e pelo arquivamento do processo, o que fundamentou com argumentos a favor da liberdade de expressão.