Katharine Hepburn "forever"
A finlandesa M-Real afirma que terá uma participação discreta na administração da Portucel, caso vença o concurso. Não quer cargos executivos e concorda com a actual administração e estratégia da papeleira portuguesa. Desvaloriza os activos florestais entregues pela dupla Cofina/Lecta e admite que a proposta dos seus concorrentes poderá ter consequências difíceis de gerir no futuro.
Quando chegou a Hollywood, era diferente de todas as estrelas e de todas as aspirantes ao estrelato: tinha um rosto anguloso, umas maçãs do rosto salientes, uns olhos penetrantes e um sotaque sofisticado da Nova Inglaterra, fruto de uma educação em Bryn Mawr e da sua origem numa família "patrícia" e culta. Fazia desporto, era magra, elegante, de uma beleza não convencional.A indústria não sabia muito bem o que fazer com ela, mas teve a sorte de se cruzar logo no primeiro filme, "Vítimas do Divórcio" (1932), com George Cukor, vindo da Broadway, aureolado com títulos de nobreza no teatro e "grande director de actrizes". O impacte foi fulminante e a figura nervosa da Hepburn, ao lado de um John Barrymore alcoólico e envelhecido, ficou na retina dos cinéfilos, ao mesmo tempo dominadora e vulnerável.Com Cukor faria mais quatro filmes, na fase mais controversa e criativa da sua longa carreira: "As Quatro Irmãs" (1933), perfeita na Jo de uma inesquecível versão de "Mulherzinhas"; o injustiçado "Sylvia Scarlett" (1935), em travesti masculino e consequente desmascaramento, ao lado do seu par ideal da década de 30, Cary Grant; "A Irmã da Minha Noiva/ Holiday" (1938), adaptado de uma peça de Philip Barry, novamente com Grant, num dos paradigmas da comédia "screwball"; e "Casamento Escandaloso/ Philadelphia Story" (1940), a "acabar com o género", ainda com Grant, num espantoso "comeback", depois de ter sido declarada como "veneno da bilheteira" - ainda numa peça de Barry, que fizera no teatro e de que comprara os direitos.No entanto, a década de 30 continha ainda alguns dos seus papéis mais relevantes (em filmes muitas vezes menores), nomeadamente como mulher emancipada (e quase masculina), longe de todos os estereótipos que lhe tentavam impor: uma mulher aviadora em "Christopher Strong" (1933), de uma das raras mulheres realizadoras, Dorothy Arzner; uma "Maria-Rapaz" em "Spitfire" (Cromwell, 1934); a ambiciosa e desajeitada protagonista de "Alice Adams" (Stevens, 1935); ou a pré-sufragista Pamela Thistlewaite em "A Woman Rebels" (Sandrich, 1936). No entanto, ganharia o primeiro Óscar na "doce" Eva de "Morning Glory" (1933) - indústria "oblige" De 1938 é o seu filme de marca, o delirante e subversivo "As Duas Feras", de Howard Hawks, em que domina e "viola", durante uma noite de vigília, com leopardos e perseguições, o pusilânime professor de Cary Grant: era o apogeu da comédia sofisticada e tresloucada e a cunhagem definitiva do mito - a mulher que "usa as calças", remetendo Grant para o papel de sexo fraco, vestido de vaporoso roupão e a gritar: "I've turned gay".A sua década de 40 é dominada pela "submissão" ao novo par, Spencer Tracy, mas contém outros interessantes veículos: o estranhíssimo "thriller" de Minnelli, "Undercurrent" (1946), ou a Clara Schumann de um do muitos "biopics" musicais, em voga na época, "Song of Love" (1947), do tarefeiro da MGM, Clarence Brown.Nos idos de 50, já envelhecida, dá réplica fabulosa a Humphrey Bogart em "Rainha Africana" (1951) e encarna a americana solteirona em "Summertime" (1955), vivendo um romance inenarrável com o galã serôdio italiano de Rosanno Brazzi. Culmina a década já a tremer de uma alegada "doença de Parkinson", na matrona da peça de Tennesssee Williams, a inesquecível Mrs. Venable, mãe do elusivo (e gay) Sebastian de "Bruscamente no Verão Passado" (Mankiewicz, 1959).Ao contrário da maioria das estrelas da sua geração, Hepburn faz, com enorme autoridade, a transição para a década de 60, a de todas as mudanças: o prestígio de uma das peças maiores de O'Neill, "Longa Jornada para a Noite" (Lumet, 1962); e "O Leão no Inverno" (1968), o papel por medida de Eleanor de Aquitânia e o terceiro Óscar: ganhou um máximo de Óscares para Melhor Actriz - quatro - sempre em filmes maus ou, na melhor das hipóteses, medianos, quando foi recordista de nomeações - 12 -, apenas batida este ano por Meryl Streep. Os anos 70 são de consagração e (dourada) decadência: Coco Chanel no musical da Broadway, Hécuba em "As Troianas" (1971), de Cacoyannis, gloriosa na Agnes de Albee na adaptação "A Delicate Balance" (Tony Richardson, 1973), e num "western" crepuscular, "Rooster Cogburn" (1975), ao lado de ... John Wayne. Fazia então peças em "tournée", que depois "filmava", como "A Matter of Gravity", de Enid Bagnold, em que a vimos, em Los Angeles, em 1976.Nos anos 80, para além de muitos telefilmes, a glória "póstuma" no insuportável "A Casa do Lago" (1981), quarto Óscar e o primeiro para o seu parceiro, o incontornável Henry Fonda, já numa velha "gagá" e rabugenta, prolongamento possível e empobrecido da sua imagem de marca. A última aparição importante (dava, muitas vezes, a cara em documentários sobre os génios a que sobrevivera, Cukor, Tracy ou Stevens, tremebunda e sempre com um tom autoritário) deu-lha Warren Beatty na velha avó de "Love Affair" (1994), "remake" serôdio de "O Grande Amor da Minha Vida".A última grande pirueta deu-a na sua imprescindível autobiografia, "Me", quando revelou que não era escorpiónica (que bem lhe ficava o ter nascido a 8 de Novembro, como todas as biografias indicavam), mas nascera a 12 de Maio de 1907. Morre agora, suprema rainha da sétima arte, senhora de todos os géneros, amaneirada, sempre um tom acima do que lhe era exigido, genial e incómoda.