Cientistas propõem que os chimpanzés entrem na nossa família
Quando Charles Darwin propôs a teoria da evolução através da selecção natural, no século XIX, que propunha que todos os seres vivos descendem de um antepassado comum e, logo, o homem tem o macaco na sua árvore genealógica, algumas pessoas ficaram muito chocadas. O homem descende do macaco? Era demais para uma senhora de sociedade que, reza a história, terá comentado: "Oh! Esperemos que isso não se espalhe!" O que diria hoje esta dama à equipa de cientistas norte-americanos que propõe agora que homens e chimpanzés sejam recatalogados como espécies do mesmo género?Os chimpanzés estabelecem complicadas relações sociais, fazem sexo apenas por prazer, aprendem linguagem gestual e usam-na de forma eficaz para comunicar, utilizam ferramentas e são capazes de transmitir os seus conhecimentos de geração para geração - ou seja, têm cultura, tal como os seres humanos. E, como se tudo isto não bastasse, somos tão semelhantes geneticamente que partilhamos 99,4 por cento dos genes. Então, por que é que ao nível da classificação das espécies não estamos inseridos na mesma categoria taxonómica, interrogam os investigadores na revista "Proceedings of the National Academy of Sciences".Tradicionalmente, os chimpanzés são inseridos na família dos pongídeos, juntamente com os outros grandes primatas (gorilas e orangotangos). Os humanos fazem parte de uma outra família, a dos hominídeos, da qual somos o único representante vivo. Mas a esta família pertencem também todos os nossos antepassados fósseis, quer os que já partilham connosco o género "Homo" (como os neandertais, por exemplo), quer os "Australopithecus".Mas, em vez de continuarmos sozinhos na natureza, como "Homo sapiens", as duas espécies de chimpanzés - "Pan troglodytes" e "Pan paniscus" - devem passar a ser designadas "Homo troglodytes" e "Homo paniscus", propõe a equipa coordenada por Morris Goodman, da Universidade Estadual Wayne, em Detroit. Para chegarem a esta proposta, os investigadores compararam 97 genes em seis espécies: humanos, chimpanzés, gorilas, orangotangos, macacos do Velho Mundo e ratinhos. O objectivo era verificar as diferenças existentes no código do mesmo gene, de espécie para espécie. O código genético, escrito com as quatro bases do ADN (identificadas pelas letras A, T, C e G), é igual para todos os seres vivos. Muitos genes são comuns a minúsculos vermes e aos homens e são mantidos ao longo da evolução. Por isso espécies que parecem muito distantes na cadeia da evolução da vida podem ter cópias iguais ou muito semelhantes dos mesmos genes. Quanto mais essenciais forem as suas funções, mais provável é que determinados genes sejam comuns a muitas espécies diferentes. Por exemplo, os genes que comandam o desenvolvimento embrionário dos vertebrados - grupo no qual se incluem todos os primatas como o homem, mas também o ratinho. Mas, quanto mais semelhantes os genes, mais próximas são as espécies.Os resultados da equipa de Morris Goodman são claros: humanos e chimpanzés apresentam uma semelhança de 99,4 por cento. Por isso, deveriam ser classificados como espécies do mesmo género - e rapidamente, enquanto ainda sobrevivem os grandes primatas, que hoje correm sérios riscos de extinção. Não é a primeira vez que é feita uma sugestão deste género. Vários cientistas, confrontados com a semelhança entre os humanos e os chimpanzés, chegaram a conclusões parecidas. Há alguns anos, o biólogo Jared Diamond escreveu um livro chamado "O Terceiro Chimpanzé", referindo-se no título aos homens. O risco de extinção que correm os grandes primatas é também um motivo para rever o seu estatuto taxonómico. Alguns cálculos apontam para que não sobrevivam hoje mais de 250 mil grandes primatas - contando com chimpanzés, gorilas e orangotangos, em comunidades muito fragmentadas em 23 países, onde são ameaçados pela guerra, pelo avanço dos madeireiros e por doenças que os dizimam. Talvez se incluirmos os chimpanzés na família do homem nos preocupemos mais com a sua sobrevivência.