"O Instituto das Artes é muito inovador na administração pública"
Um ano depois de ter sido anunciada a fusão do Instituto Português das Artes do Espectáculo (IPAE) com o Instituto de Arte Contemporânea (IAC), foi ontem finalmente aprovada a criação do novo Instituto das Artes (IA) em Conselho de Ministros. Será regido por uma lei orgânica "inovadora", diz o secretário de Estado da Cultura, José Amaral Lopes. A sua estrutura vai ser mais flexível e mais ágil, acrescenta. Apesar da fusão, o IA vai por enquanto funcionar nos actuais edifícios do IPAE e do IAC, ambos em Lisboa, e manterá os actuais 89 funcionários dos institutos agora extintos. O seu director já está escolhido mas Amaral Lopes não quer avançar nomes. A missão do novo instituto é "apoiar a criação e as formas de expressão artística, valorizar a cultura portuguesa e a formação de novos públicos" e criar condições para que cada vez mais portugueses "fruam" a Cultura. Na agregação das duas estruturas pouparam-se 326 mil euros, valor que ficará no orçamento do Instituto das Artes. Esta é a penúltima das fusões propostas pelo Governo: a última fusão será, também do Ministério da Cultura, a do Ippar (Instituto Português do Património Arquitectónico) com o IPA (Instituto Português de Arqueologia).JOSÉ AMARAL LOPES - Flexibilidade. Esta lei orgânica é muito inovadora face ao que está instituído na administração pública. Por exemplo, nos termos da lei, o director do departamento de teatro do IPAE era obrigado a ser funcionário da administração pública. Por exemplo, Gil Mendo, a quem toda a gente reconhece mérito, não podia ser director do departamento de dança porque não era funcionário público. Corríamos o risco de ter pessoas nas direcções que não tinham sensibilidade para áreas que não eram as suas. Agora pode-se recrutar técnicos e pessoas especializadas sem vínculo à função pública.Quantos departamentos vai ter?Vamos ter três grandes departamentos fixos: um para a gestão interna, um de apoio à criação e difusão e outro para o desenvolvimento de condições de fruição (descentralização e formação de públicos). São as grandes áreas de actuação. Desaparece a sectorialização, isto é, deixa de haver um departamento para cada área [teatro, dança, música, etc.]. A grande inovação é a criação de unidades funcionais [os gabinetes de expressão artística, de especialização e de apoio técnico]. Ou seja, são gabinetes que têm uma flexibilidade que varia em função dos projectos e necessidades; são gabinetes especializados ou transdisciplinares para desenvolver e acompanhar projectos. Por exemplo, imaginemos que é necessário fazer o levantamento de todos os equipamentos do país ou a preparação de Coimbra Capital Nacional da Cultura. Podia ter-se justificado a criação de um desses gabinetes. Outro exemplo: está prevista a informatização das bilheteiras de todos os recintos culturais - cria-se um gabinete para fazer o estudo, aplicar e acompanhar no terreno a implementação do sistema de informatização, que, depois de concretizado, desaparece. A Bienal de Veneza é outro exemplo. Este diploma já prevê uma articulação com as autarquias e com as delegações regionais. Estabelece-se uma relação institucional mais duradoura entre o IAC e as delegações regionais. O sistema está pensado para integrar cada vez mais as autarquias no sistema de financiamento. Outra das novidades é a internacionalização: também no domínio das artes é preciso criar raízes e para isso é preciso instituir e encontrar parceiros em determinados países e que exista reciprocidade. São gabinetes que podem ter a duração de vários anos. É mais fácil verificar se os projectos estão ou não a existir porque os gabinetes são criados para projectos. A filosofia é esta e a difusão vai ser a base de tudo. Na prática, todo o sistema de apoios está embrenhado com alguns dos moldes que a difusão tinha - a ligação com as autarquias, as co-produções, as deslocações.Se a internacionalização da imagem do país é uma aposta deste ministério, porque é que o novo instituto não prevê um departamento para esta área?Não podemos raciocinar como na administração pública central. A novidade é que tudo isto passa a ser muito mais flexível. As pessoas existem, os gabinetes são formados para agregar as pessoas em relação ao projecto. Aposta-se na transversalidade.Quantas pessoas vai ter o novo instituto?O novo instituo garante transição de todo o pessoal, mesmo os que têm contratos individuais de trabalho, e mantém-se o vínculo jurídico. São 73 pessoas do IPAE e 16 do IAC. Na direcção, há um director e dois sub-directores. E onde vai ser a sede?Para já é a sede que os dois institutos têm, vai funcionar nos dois sítios. Enquanto não tivermos as instalações adequadas vai ter que ser. Como é que esta lei orgânica vai fundir e não juntar dois institutos se eles continuam fisicamente separados?Para já há necessidades de reafectações de equipamentos para a instalação de alguns serviços do ministério, até porque alguns estão pulverizados e precisam de obras. Mas não se faz tudo de uma vez. Não estamos numa situação financeira desafogada, não vamos estar a canalizar investimentos para isso. Então o que é que nesta lei garante que vai haver uma fusão e não um junção?O facto de acabar com a sectorialização e departamentalização excessiva. Por natureza, em funções institucionais, aplicam-se procedimentos de acordo com as regras instituídas. Mesmo que os funcionários do IPAE e IAC não concordassem com as regras, tinham que funcionar de acordo com as regras instituídas. Cada um especializava-se e às vezes não tinha tempo nem era motivado para apreciar os projectos do lado (como se fossem gavetas fechadas e só os que lá estavam é que sabiam o que se passava). Ao acabar com esta departamentalização, o novo instituto vai fazer com que as pessoas se cruzem. Isto é criar a estrutura, isto é a ferramenta para aplicar a política que o Governo decidir para o sector. Vai mudar desde logo porque o que o IAC fazia era a aquisição de obras, alguns apoios na representação a bienais... não criou hábitos de atribuição de prémios, de apoios às artes plásticas. Criticou-se esta fusão pelo facto de agregar um instituto com uma estrutura leve como o IAC a uma estrutura pesada como o IPAE. Alguns artistas temiam que a sua representação institucional, o IAC, desaparecesse...Alguns artistas diziam exactamente o contrário: queixavam-se que não havia critérios objectivos e que era um instituto para amigos. Não estou a dizer que agora vai ser perfeito. Mas, tirando os poucos privilegiados, muitos artistas não tinham acesso a nada do que se fazia no IAC. Esta fusão e a fusão do IPA/Ippar vão ser as últimas de todas as fusões anunciadas pelo Governo a concretizar-se. Porquê este atraso?O ministro já explicou: há determinados aspectos que são complexos, este sector não é igual aos outros. Por isso é que esta lei é inovadora. Até o grupo de trabalho não chegou a consenso, ouviram-se pessoas conceituadas e todos tiveram opiniões diferentes. O ministro sentiu necessidade de acompanhar as duas coisas. Se construíssemos um instituto tradicional, a aplicação dos apoios era difícil.