Xanana Gusmão pode pedir alargamento da presença da ONU no território
Num discurso proferido hoje perante diplomatas acreditados em Díli, o Presidente da República timorense analisou a actual instabilidade que se vive em Timor-Leste, deixando um conjunto de recomendações e apelos, muitos deles virados para a questão da segurança.
Apesar de reconhecer que "é difícil pensar-se na extensão do mandato" da força de paz da ONU, Xanana Gusmão manifestou pela primeira vez publicamente o seu desejo de estudar "a necessidade" de alargar a presença dos "capacetes azuis" para além de Junho de 2004.
O Presidente timorense falava ao corpo diplomático no Palácio da Cinzas, em Díli, 48 horas depois da reunião alargada e extraordinária do Conselho de Ministros em que a maioria destes temas foram analisados.
Apelando à necessidade de não se dramatizar excessivamente os recentes problemas, incluindo a violência que assolou Díli no dia 04 de Dezembro, Xanana Gusmão destacou um conjunto de problemas "pertinentes" que requerem solução imediata.
"A população (...) está assustada e vive em pânico", considerou. "Existem grupos organizados, com algumas armas, que assaltam casas da população e tiram todo o pouco que a população tem. Esses grupos andam em bandos e actuam numa grande extensão de terreno", sublinhou, referindo que os autores "continuam impunes e à solta".
É nesse quadro que Xanana Gusmão defende uma revisão do papel das forças de segurança em Timor-Leste, quer no que toca às emergentes instituições nacionais quer sobre a presença dos "capacetes azuis" e polícias internacionais.
Só assim, considera, é possível reforçar a "política de não tolerância" relativamente ao que classifica como "práticas de vandalismo" que continuam a gerar instabilidade em vários pontos do país.
Os apelos de Xanana Gusmão surgiram aliados a vários comentários, alguns dos quais bastante críticos, sobre recentes actuações das forças de segurança, incluindo das estruturas das Nações Unidas.
Referindo-se em especial aos acontecimentos de Dezembro, Xanana Gusmão criticou a forma "apática" como as instituições do Estado reagiram à situação que se instalou na capital timorense, e que causou dois mortos e dezenas de feridos. "A reacção da UNMISET foi incrivelmente morosa, mais em termos de defender interesses do que de agir em iniciativas para assegurar a estabilidade", disse.
"Não quero afirmar que, sob o comando timorense as coisas teriam corrido melhor mas o que é certo é que se notou um embaraço, uma atrapalhação, quando se estava a exigir uma tomada rápida de decisões", sustentou.
Para o chefe de Estado, o verdadeiro sucesso da presença de forças de segurança em Timor-Leste deve-se medir não pelo calendário de redução da sua presença mas pela estabilidade que fica no país depois da sua saída.
Um quadro especialmente importante já que, concluída essa redução, a responsabilidade pela lei, ordem e segurança ficará apenas nas mãos de timorenses, o que obriga a analisar quer o papel das forças militares quer da polícia.
Forças nacionais ainda não estão prontas para agirReferindo-se à decisão de colocar uma companhia das forças nacionais (FALINTIL/FDTL) nas "operações de estabilização" em curso a sudoeste de Díli, Xanana Gusmão admite que a estrutura militar timorense "não está nas condições mais desejáveis". "Demasiado inactiva e improdutiva no processo", as FALINTIL/FDTL terão que lutar para ultrapassar os actuais obstáculos, garantindo que só assim não se transformarão numa força "amorfa e sem capacidade de intervenção".
"A FDTL tem um papel a cumprir neste contexto de assegurar e garantir a estabilidade no país, em particular quando a mesma está tão claramente ameaçada", frisou.
Igualmente importante é a revisão do processo de formação da polícia timorense, cuja actuação a 03 de Dezembro - numa operação numa escola da capital -, levou, para Xanana Gusmão, aos acontecimentos do dia seguinte. "A polícia timorense, nestes últimos meses e por vários motivos, ficou um tanto ou quanto abalada na sua credibilidade", disse.
Para colmatar esse problema, Xanana Gusmão defende um maior envolvimento do Governo timorense na política de formação e no comando da polícia nacional "a fim de, não só capacitar como evitar, no futuro, que haja acusações de parte a parte".
O presidente timorense retomou ainda o tema do poder local, defendendo a realização urgente de eleições para colmatar o "prolongado vazio de poder nas estruturas de base" e para garantir um maior fluxo de informação no país.
Um processo que pode avançar paralelamente ao registo da população, uma das medidas aprovadas na reunião alargada de sábado.
O discurso do líder timorense, em apresentação de cumprimentos ao corpo diplomático, serviu assim para "uma nova chamada de atenção a toda a comunidade internacional presente em Timor-Leste".