Cadela Laika só viveu cinco a sete horas
A cadela Laika - o primeiro ser vivo em órbita da Terra, a bordo do satélite Sputnik 2, lançado pela União Soviética a 3 de Novembro de 1957 - não morreu exactamente como tem rezado a versão oficial soviética, noticiou ontem a BBC Online. Não viveu tanto tempo, nem teve a morte pacífica e sem sofrimento anunciada ao mundo pelas autoridades da então União Soviética, acaba de revelar o russo Dimitri Malashenkov, do Instituto para os Problemas Biológicos, em Moscovo, no Congresso Mundial do Espaço, em Houston, nos Estados Unidos. As revelações surgiram pouco tempo antes da comemoração dos 45 anos da viagem da Laika, se vêm pôr fim a anos de especulações sobre o que aconteceu à cadela. Ao apresentar no congresso uma comunicação intitulada "Algumas páginas desconhecidas do primeiro voo orbital de organismos vivos", Dimitri Malashenkov disse que a Laika faleceu cinco a sete horas depois de estar em órbita devido ao pânico e excesso de calor na cápsula onde seguia no Sputnik. Não sobreviveu vários dias ou talvez até uma semana, como asseguraram as autoridades soviéticas então.Em plena Guerra Fria, a União Soviética surpreendeu o mundo com o lançamento do primeiro satélite no espaço - o Sputnik - a 4 de Outubro de 1957. Foi um balde de água fria para os Estados Unidos, a grande potência ocidental.Nem um mês depois do lançamento do Sputnik, uma esfera de metal com 18 quilos, os soviéticos voltaram a marcar pontos na corrida ao espaço, ao lançarem um segundo satélite, o Sputnik 2. Em forma de cone, pesava 113 quilos e levava o primeiro ser vivo a entrar em órbita terrestre - a Laika, que viajava numa cabina selada. A Laika era uma cadela vadia, que andava perdida pelas ruas de Moscovo. Pouco depois da partida do Sputnik 2, a União Soviética anunciou que a cadela iria morrer no espaço, o que indignou muita gente, mas naquela época não havia capacidade de fazer regressar a cadela à Terra com segurança. Mesmo assim, a Laika deveria viver uma semana, já que o sistema de apoio à vida foi concebido para durar esse tempo. No voo espacial, vários sensores colocados na cadela davam informações sobre a respiração, a pressão arterial, as pulsações cardíacas e os movimentos do corpo. Uma câmara de televisão também observava Laika e transmitiu imagens para a Terra, a par dos dados registados pelos sensores. Agora, Dimitri Malashenkov também deu mais pormenores sobre a concepção do compartimento onde viajou a Laika. Além de poder manter a vida durante sete dias, a comida e a água para a cadela era gelatinosa, havia um aparelho para absorver o dióxido de carbono e outro para produzir oxigénio, uma ventoinha que se activava automaticamente quando a temperatura do ar excedesse os 15 graus Celsius e arrefecer o ar, correntes de metal para impedir o animal de se movimentar pela cápsula (só podia levantar-se, sentar-se e deitar-se), e um saco para recolher os dejectos. De facto, para adaptar a Laika às condições apertadas da cabina, as autoridades soviéticas treinaram vários cães. Mantinham-nos em gaiolas pequenas durante 15 a 20 dias, só que isso levava os animais a reter a urina e as fezes e, por conseguinte, a ficarem desassossegados e à degradação geral das suas condições físicas. Foram seleccionados três cães para o Sputnik 2: além da Laika, a Albina e a Mushka. A Albina já tinha voado duas vezes num foguetão de grande altitude e era a substituta da Laika, enquanto a Mushka foi usada para testar instrumentos e sistemas de apoio à vida. O problema foi que a temperatura e a humidade subiram gradualmente na cabina, até que ao fim de cinco a sete horas de voo as equipas em terra deixaram de receber quaisquer sinais vitais da Laika. À quarta órbita da Terra, os soviéticos não conseguiam obter informações sobre a cadela, que já teria morrido de calor. Transformado então em caixão, o Sputnik 2 deu 2570 voltas à Terra, reentrando e queimando-se na atmosfera terrestre a 14 de Abril de 1958, depois de 162 dias em órbita. Mesmo sem o sucesso a que os soviéticos fizeram crer, a Laika forneceu os primeiros dados sobre o comportamento de um organismo vivo no espaço. Isso era fundamental antes de mandar alguém lá em cima. O primeiro homem a fazê-lo foi Iuri Gagarin, a 12 de Abril de 1961.