Timor, o país número 191
A partir de ontem passou a haver mais uma bandeira junto à sede das Nações Unidas em Nova Iorque. Três mastros à direita da bandeira de Portugal está hasteada uma outra, preta, branca, vermelha e amarela. São as cores timorenses. É oficial: Timor-Leste é um país independente e membro de pleno direito da comunidade internacional. Ontem, Timor passou a ser uma das 191 Nações Unidas.A Assembleia Geral (AG) das Nações Unidas aprovou ontem por aclamação (sem necessidade de uma votação) a adesão de Timor-Leste à ONU. O Presidente de Timor, Xanana Gusmão, o seu primeiro-ministro, Mari Alkatiri, o ministro dos Negócios Estrangeiros José Ramos-Horta e o bispo Ximenes Belo participaram numa sessão cheia de simbolismo, sentados na Assembleia por trás de uma placa que dizia "East Timor".A adesão de Timor à ONU foi formalmente proposta por Portugal, e por isso o primeiro-ministro português, Durão Barroso, também se dirigiu à AG. Entre citações de Pessoa e Camões, Durão notou que a adesão "não é o fim do caminho" e que a existência do jovem país depende da manutenção do apoio da comunidade internacional.Timor é um exemplo "da humanidade no seu melhor", disse o primeiro-ministro à imprensa. "Até no plano pessoal isto significa muito. Andei muitas vezes por estes corredores [da ONU], e os delegados de outros países nem queriam ouvir falar de Timor. Diziam que a independência era [um objectivo] irrealista. A moral da história é que não devemos desistir quando sabemos que temos razão."Na sua intervenção perante a AG, em inglês, Xanana traçou a história da luta do povo timorense e elogiou o "sentido de Estado" de Portugal, Austrália e Indonésia por co-patrocinarem o projecto que faz de Timor o 191º membro das Nações Unidas. "Hoje tenho o enorme privilégio de representar aqui um pequeno povo, cheio de dignidade e extraordinária bravura no passado (...) e imbuído de confiança no futuro", disse o Presidente de Timor.Xanana também mencionou o seu "convidado especial", o prémio Nobel Ximenes Belo; o bispo de Díli acompanhou a delegação timorense, ao contrário do de Baucau - Basílio do Nascimento "teve, por sentido de responsabilidade", de ficar em Timor.O Presidente de Timor também enunciou o que serão as prioridades do novo país na cena internacional. Como a insistência na solidariedade internacional, no perdão da dívida externa dos países mais pobres e no levantamento das barreiras alfandegárias dos países ricos. E prometeu a futura participação de Timor numa série de tratados e instituições internacionais.Logo depois do discurso de Xanana, Timor teve o seu primeiro acto oficial na ONU, com o seu embaixador José Luís Guterres a participar na votação dos novos membros não-permanentes do Conselho de Segurança. Xanana Gusmão participou ainda na cerimónia oficial do hastear da bandeira timorense. O Presidente de Timor ouviu o hino do seu país e viu a sua bandeira ser hasteada na companhia de Mari Alkatiri, Durão Barroso e do secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan. Junto ao palanque, Ramos-Horta, normalmente sisudo em público, mostrava um largo sorriso.Antes desta cerimónia, Xanana e Ramos-Horta participaram numa conferência de imprensa, onde o Presidente timorense salientou as "boas relações com Jacarta, com o Governo e o Exército, com a sociedade civil e o povo indonésio". Um jornalista fez-lhe a pergunta obrigatória, como se sente ao ver o sonho de Timor reconhecido como nação a concretizar-se. Xanana hesitou, conferenciou com Ramos-Horta para confirmar como se pronuncia a palavra inglesa "overwhelmed" ("esmagado", "assoberbado"). "Sinto-me 'overwhelmed' pelos desafios que nos esperam. E orgulhoso, claro."