Comandantes da PSP do Porto com currículo polémico
Gomes Pereira e Machado da Silva, os responsáveis máximos pelo Comando Metropolitano do Porto da PSP recentemente empossados pelo director nacional da corporação, desempenharam funções de chefia num dos períodos mais conturbados da história do comando distrital. Em Junho de 1994, quando um agente da PSP, Domingos Antunes, baleou o detido Romão Monteiro na esquadra de Matosinhos, o actual comandante Gomes Pereira ocupava o segundo lugar da hierarquia do comando, então alvo de severas críticas pela difusão de um comunicado que subscrevia a tese de suicídio, rapidamente contrariada pela autópsia. Machado da Silva comandava a divisão de Matosinhos da PSP. Nunca se pronunciou publicamente sobre o assunto.Ambos regressam agora ao Porto na ressaca de um novo Verão quente no comando metropolitano, marcado pela morte de um suspeito no quadro de uma operação policial na Rua do Passeio Alegre, a 5 de Agosto. O director nacional da PSP, Mário Morgado, não gostou da forma como Herlander Chumbinho, então responsável pelo comando, lidou com o assunto. Não perdeu muito tempo: em duas semanas, ordenou a sua exoneração do cargo por "incumprimento de ordens hierárquicas" e avisou que "o prestígio da polícia não se compadece com amadorismos nas relações com a comunicação social" quando estão em causa "situações delicadas". Recorde-se que o comunicado emitido no dia seguinte ao incidente, e assinado pelo próprio Chumbinho, afirmava que o disparo fatal tinha surgido na sequência do envolvimento físico entre o polícia e a vítima. Mais tarde, em conferência de imprensa, a PSP emendava a mão, dando o tiro como "acidental".Curiosamente, o homem escolhido para substituir Chumbinho, Gomes Pereira, era o segundo na linha de comando quando a PSP Porto teve de lidar com um processo de contornos semelhantes, em 1994. Quando, a 9 de Junho desse ano, Domingos Antunes baleou mortalmente um feirante de etnia cigana detido na esquadra de Matosinhos, a primeira reacção do comando distrital do Porto foi emitir um comunicado onde se garantia que a vítima se tinha suicidado após roubar a arma a um agente. Conclusões de perícias posteriores e da autópsia, assim como as testemunhas oculares que viram Romão Monteiro entrar algemado para a sala de interrogatórios da esquadra, desmentiram essa versão, de que o comando nunca se retractou. Domingos Antunes viria a ser condenado pelo crime de homicídio por negligência, tendo-lhe sido aplicada uma pena de três anos de prisão, suspensos por quatro anos, e uma pena acessória de expulsão da PSP, mais tarde anulada pelo Supremo Tribunal de Justiça.Na altura, o episódio foi lido como um sintoma particularmente grave do corporativismo policial e da sua crónica cultura de encobrimento. O comando, então liderado por Ramos de Campos, nunca alterou a versão inicialmente tornada pública nem desencadeou mecanismos disciplinares internos à margem do processo judicial; a divisão de Matosinhos, onde estava Machado da Silva, refugiou-se no silêncio. E a tutela nunca pareceu incomodada. Dias Loureiro, então ministro da Administração Interna, limitou-se a declarar: "Quando deixar de confiar no comando da PSP, demito-o. Mas não é esse o caso". Nos últimos anos, Gomes Pereira chefiou o Comando Distrital de Braga, onde terá tido uma carreira mais tranquila. Ao contrário de Machado da Silva, que passou o Verão em sobressalto no Comando Distrital de Setúbal, de que foi responsável máximo até à sua transferência para o Porto, na passada terça-feira. O caso mais grave com que teve de lidar foi o tiroteio no Bairro da Bela Vista, a 20 de Junho último, de que resultou um morto, atingido à queima-roupa por um polícia. Na altura, a PSP argumentou que os protagonistas da rixa estavam armados e Machado reafirmou a confiança nos seus homens, mas a versão dos moradores foi em sentido contrário: de acordo com várias testemunhas, a integridade física dos polícias nunca esteve em causa e a vítima mortal, Manuel António Tavares, só foi alvejada por ter questionado o comportamento dos agentes policiais. O inquérito aberto pela Inspecção-Geral da Administração Interna continua em curso.No início de Julho, o comando de Setúbal voltou a fazer notícia com a carga policial a cidadãos brasileiros que festejavam o pentacampeonato do mundo na Costa da Caparica - dos confrontos resultaram sete feridos ligeiros um dos quais agente da PSP. Mais recentemente ainda, um jovem de 26 anos detido por suspeita de furto suicidou-se por enforcamento com o cordão das calças do fato de treino na cela do Comando Distrital da PSP de Setúbal. O jovem, que não tinha cadastro, fora capturado por populares na sequência do furto de uma carteira no centro de Setúbal e estava detido há apenas três horas. Na ocasião, os familiares estranharam que a vigilância da PSP não tivesse notado as movimentações do jovem na cela, mas fonte do comando garantiu que as novas regras de respeito pela privacidade dos detidos impedem as câmaras de captar tudo o que se passa no interior da cela.Leg: Gomes Pereira (na foto) teve uma carreira mais tranquila no Comando Distrital da PSP de Braga