Portugal é o quarto país da Europa com mais quilómetros de portagens
Quando comparado com os seus congéneres europeus, o território nacional parece mesmo um "cantinho" à beira-mar. Mas se a comparação se medir em quilómetros de auto-estradas com custo para os utilizadores, aí o caso muda de figura e o país entra na disputa por um lugar no pódio. É que, no nosso país, actualmente, são cobradas portagens em 1209 quilómetros, o que o coloca em quarto lugar na Europa, depois da França, Itália e Espanha. E com o anúncio do fim das auto-estradas sem custos para o utilizador (Scut), a esta extensão vão-se juntar mais 908 quilómetros onde também serão cobradas portagens (ver mapa), uma medida, segundo o Governo, em prol do equilíbrio das contas públicas, mas cuja poupança efectiva o executivo não consegue medir com precisão. Quando o mapa das Scut com portagem se tornar real, Portugal vai ter quase tantos quilómetros de auto-estradas pagos como a Espanha, actualmente com 2320 kms concessionados a empresas. Mas para que a comparação seja mais objectiva, convém referir que se o país vizinho tem a mesma extensão de auto-estradas pagas, ocupa uma área territorial mais que cinco vezes superior à portuguesa. De acordo com um relatório da Asecap (associação que representa 12 países europeus que exploram mais de 18 mil kms com portagem), o grande líder europeu das portagens é a França, que com uma área de 551 mil quilómetros quadrados cobra portagens em 7603 kms, seguindo-se a Itália, com 5593 kms objecto de pagamento para uma área de 301 mil quilómetros quadrados. Portugal, com os seus 92 mil quilómetros quadrados, é actualmente o quarto país europeu com mais quilómetros com custos para o utilizador. Se compararmos a área do território nacional com a extensão das auto-estradas concessionadas, o país fica ligeiramente abaixo da média europeia (um quilómetro de auto-estrada paga por cada 92 quilómetros quadrados, contra 72 quilómetros quadrados na França). Mas depois de 2004, altura em que as Scut passam a ter portagens, a taxa agrava-se significativamente: nessa altura, haverá um quilómetro de auto-estrada com custos por cada 41 quilómetros quadrados de território.Ao todo, em Portugal, há 15 auto-estradas exploradas por quatro companhias, quando em Espanha a exploração é repartida por 26 empresas. Desse total, 11 estão sob a égide da Brisa, que controla, desde a inauguração do último troço que liga Lisboa ao Algarve, 1000 kms de auto-estrada (ver caixa ao lado). Sobram a A7 e A11, exploradas pela Aenor - Auto-Estradas do Norte; a A8 e A15, concessionadas pelo Estado às Auto-Estradas do Atlântico; e, por último, a Ponte Vasco da Gama, explorada pela Lusoponte. Ainda de acordo com o mesmo relatório, as cobranças feitas nas 79 praças de portagem existentes em Portugal geraram receitas, em 2001, de 415 milhões de euros. A França, na sua qualidade de líder, arrecadou 5200 milhões de euros, seguindo-se a Itália, com 3300 milhões de euros, e a Espanha, com 1700 milhões. Conforme se pode ler no relatório e contas do primeiro trimestre da Brisa, 58 por cento do total de receitas são cobradas através da "Via Verde", sendo que 16 por cento dos pagamentos são efectuados com recurso ao Multibanco e 25 por cento por cobrança manual. Em 2001, passaram pelo asfalto com barreiras de portagem português 9557 milhões de veículos - 7353 milhões de passageiros e 2204 milhões de pesados. Se as projectadas Scut fossem grátis, Portugal manteria, face aos valores europeus, uma rede de auto-estradas pagas equivalente ao seu território. Mas as recentes declarações do ministro das Obras Públicas, Transportes e Habitação ao PÚBLICO não deixam margem para dúvidas: auto-estradas sem custos para os utilizadores (Scut) vão deixar de ser uma realidade em Portugal. Isto porque se trata, segundo Valente de Oliveira, de um sistema insustentável (ver caixa nesta página), sendo ainda que o Governo quer incutir o princípio do "utilizador-pagador" e não, como até agora, do "contribuinte-pagador". Por isso, e já a partir de 2004, todas as sete auto-estradas em construção vão ter portagens. Mas há excepções: "Quem vive, trabalha ou investe no interior, no âmbito de uma medida discricionária positiva, não pagará portagem". Pelo que se levanta a dúvida se com este regime de excepção e com a obrigatoriedade de pagamento de portagem para os restantes utentes há ou não uma redução do tráfego inicialmente previsto no contrato de concessão celebrado pelo Estado e uma consequente perda de receitas para a concessionária. Matos Viegas, administrador-delegado da Scutvias, que tem a concessão da Scut da Beira Interior, declarou ao PÚBLICO: "É inevitável que haja perda de tráfego nos primeiros anos e esse é o nosso problema". Isto porque, consequentemente, é também inevitável "a perda de receitas", o que contribui para "o desequilíbrio financeiro" da empresa, adiantou. O responsável da Scutvias não tem dúvidas de que essa perda de proveitos "terá de ser suportada pelo Estado" e explica porquê: "A auto-estrada foi posta a concurso com determinado tráfego previsível. Se há agora um alteração das condições, essa tem que se reflectir no equilíbrio financeiro da concessão". Assim sendo, e uma vez que é o próprio Estado a alterar as regras do jogo, terá de ser este, na opinião de Matos Viegas, a "suprir a perda de receitas". De resto, a Scutvias, tal como outras concessionárias contactadas pelo PÚBLICO, não avançou mais sobre a matéria, pois ainda não foi oficialmente contactada e informada pelo Governo, tendo tido conhecimento da decisão política através dos órgãos de comunicação social.