Gorillaz e Morcheeba desiludem no "Isle Of MTV"
O espaço relvado, rodeado por árvores, junto à Torre de Belém, em Lisboa, tinha um aspecto agradável. As atenções dividiam-se por três palcos, por um espaço 'chill-out' e por duas zonas lúdicas, que foram bem aproveitadas. O princípio da noite mostrava-se ventoso, mas depois amainou. O público afluiu em grande número, apesar de, provavelmente, não estarem presentes as 10 mil pessoas que a organização ambicionava. Muita da assistência era estrangeira - um número significativo de jornalistas de todo o mundo, mas também turistas de passagem por Lisboa. Ou seja, parecia estarem reunidas as condições para uma noite de música para mais tarde recordar na primeira edição do evento "Isle Of MTV" em Lisboa. É claro que existiram alguns equívocos - como a ordem e a hora de entrada em palco das bandas ou uma escolha de DJs redundante - e problemas de organização, nomeadamente de luz e som, que prejudicaram muito os espectáculos. Era penoso, por exemplo, estar a assistir a um concerto e a ouvir a música do DJ do palco ao lado e vice-versa. Mas mesmo assim, que diabo!, Lisboa ia poder assistir, pela primeira vez (e o mundo, pela última, porque não vão dar mais espectáculos este ano), a um concerto da banda-fenómeno da pop-rock, os Gorillaz, à apresentação do novo álbum dos Morcheeba, "Charango", ou à estreia em palco dos franceses Cassius. Mas nada, literalmente nada, correu bem. E o princípio de noite até prometeu. Os Da Weasel conseguiram agarrar o público com a noção de espectáculoque lhes é reconhecida, com a secção rítmica e os dois cantores a mostrarem grande desenvoltura em palco. Seguiu-se o DJ norte-americano Roger Sanchez que, apesar de uma selecção de música house 'dejá vú', conseguiu entusiasmar os muitos que se colocaram defronte do palco principal. Nos outros dois palcos mais música house pelos portugueses Rui Vargas e Yen Sung e pelo alemão Ian Pooley, com o primeiro a conseguir colocar muita gente a dançar. Com a chegada da dupla francesa Cassius veio a primeira desilusão. Assumidamente hedonistas e excessivos na forma como coadunam música house com 'disco', funk ou electro - na linha dos compatriotas Daft Punk -, Phillippe Zdar e Boombass, em gira-discos e maquinaria, nunca conseguiram entusiasmar com uma sonoridade previsível. As presenças da diva soul, Jocelyn Brown, ou do cantor Steve Edwards ainda conseguiram animar os presentes, mas nada que mereça ficar registado na memória. Pior mesmo só os Morcheeba e os Gorillaz, até porque a fasquia era muito mais elevada. Os primeiros foram sonolentos e baços. O DJ passou o tempo a mostrar que estava com os copos, o guitarrista passou o tempo a fazer solos desnecessários e, apenas a simpatia e subtileza da cantora Sky Edwards, atenuou ligeiramente o desastre. Uma pena, até porque o último álbum do grupo, "Charango", é composto por algumas boas canções e é muito melhor que o anterior "Fragments Of Freedom". É verdade que foram prejudicados por uma quebra de energia que interrompeu o desenrolar do concerto durante 30 minutos, mas isso não chega para justificar tanta falta de respeito para com um público que os tem em boa conta. E que, naturalmente, suspirou de alívio quando se foram embora sem encore. Em relação aos Gorillaz o caso é ainda mais grave. Podemos tentar relativizar a coisa dizendo que os músicos, com destaque para o cantor Damon Albarn, tinham alguma razão em estar chateados com o facto do som do palco do lado se ouvir. Até se pode dizer que o conceito de espectáculo dos Gorillaz não funciona muito bem num evento daquelas características, onde existe uma grande dispersão. Desfrutar do jogo imagens-sons exige alguma disponibilidade e a maior parte das pessoas parecia não estar consciente que não iria assistir ao tradicional concerto pop-rock, mas sim a imagens projectadas num ecrãn, com as silhuetas dos músicos em fundo (apesar do jogo de sombras não ter resultado, ao contrário do que normalmente sucede). Até se pode falar da hora tardia a que tudo começou (quase 4 da manhã!), quando já existiam traços de cansaço e a maior parte das pessoas necessitava de música enérgica e não narcótica. Mas nada disso justifica a falta de empenho dos músicos e de Damon Albarn (a excepção, mesmo assim, foram os dois 'rappers' de serviço) e o inexistente dinamismo do grupo. Momentos ouve que parecia estarmos perante uma banda de garagem que não ensaiava há meses. Uma desilusão total! Ainda por cima, o grupo mudou nos últimos meses o jogo de imagens projectado na tela sem ganhos visíveis para quem vê. Enfim, um concerto para esquecer, tanto mais incompreensível para quem já teve oportunidade de assistir a anteriores espectáculos do grupo, onde a energia, a capacidade de diálogo entre os músicos e com o público, e uma invulgar noção de espectáculo, são as notas dominantes. No final de festa, os resistentes ainda dançaram ao som do tecno-house dos Layo & Bushwacka, da música house de DJ Vibe ou dos X-Press 2, mas o melhor de tudo foi a descoberta de um espaço com potencialidades. Do ponto de vista da música, com a excepção dos Da Weasel e de alguns momentos proporcionados pelos DJs, foi para esquecer.